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Desde o inaugural concerto, em 1990, dos três tenores (Carreras, Domingo, Pavarotti) reunindo em performances solistas e grupais, de características nitidamente midiáticas, árias de ópera e hits do musical e do pop/rock, esta fórmula vem quebrando as fronteiras entre o clássico e a música fora deste contexto.
O que, se de um lado impulsiona comercialmente a carreira de
cantores de substrato lírico, por outro enfrenta os riscos do apelo fácil e do
descartável. Provocando inclusive, em alguns casos, o afastamento dos palcos
operísticos, agravado em países como o nosso onde o gênero sobrevive a duras
penas.
Impulsionado por seu revelador talento vocal, o paulista
Thiago Arancam vem desenvolvendo uma ascendente carreira como tenor spinto, trafegando entre o lírico e o dramático. Favorecido
por apurados estudos na Academia do Alla Scala (Milão) e por elogiadas
performances (inclusive sob a regência de Placido Domingo).
Num repertório com prevalência do verismo italiano entre Puccini
e Mascagni ao romantismo tardio de Alfano, inclusive com uma raramente
apresentada obra deste último – Cyrano de
Bergerac, onde Arancam atendeu a outro chamado de Placido Domingo. Mas com
incursões também em Bizet, onde protagonizou Carmen em apresentações no exterior, embora tenha enfrentado vaias
do público e a ira da crítica argentina quando foi o Don José no Colón.
Em nossos palcos estreou em 2011, no Municipal carioca, com
uma conceituada Tosca e em Carmen e Fosca (Carlos Gomes), em 2014 e 2016, respectivamente no Municipal
paulista. Além de seus inúmeros concertos/shows que, nos últimos anos, passaram
a incluir programas diversificados. Do canto lírico extensivo, na sua estética
interpretativa, ao cancioneiro popular internacional de caráter antológico/comercial.
Nas constantes idas e vindas, entre a Europa e o Brasil, vem
lançando bem sucedidas gravações nesta linhagem mais vendável. E, agora, avança em sua
carreira com um primeiro musical – O
Fantasma da Ópera. Produção paulista que protagoniza por indicação seletiva
autoral (Andrew Lloyd Webber), num dos maiores êxitos da atual temporada.
Na sua mais recente tour nacional, titulada Bela Primavera, mantém sua opção vocal em torno do pop/lírico, com
alguns clássicos do rock, canções italianas e brasileiras. Ora com Who Wants to Live Forever, ora com How Can I Go On, onde faz um
tributo remissivo ao celebrado dueto Fred Mercury/Montsserat Caballé, pela recente
morte da soprano espanhola. Ou, ainda com a dúplice atuação dele e da soprano (Carmen Monarcha), incluindo o tema titular e o celebrado All I Ask of You de O Fantasma da Opera.
Mas, para quem já assistiu à sua recente montagem e que Arancam integra como tenor/ator, há um arroubo incisivo e contínuo da sua parte e menor convencimento, com um excessivo vibrato, da cantora convidada para sua versão no show Bela Primavera. Havendo distanciamento crítico na atuação, se comparada for à do elenco protagonista feminino no musical paulista, e mais acerto dela nos duetos do Queen.
De perceptível envolvência qualitativa são, aqui, as atuações de Thiago Arancam,
embora sujeitas às naturais oscilações de súbitas passagem de fraseados graves para
as extensões mais agudas do registro lírico, ao atribuir suas nuances vocais ao canto popular. Com adequada funcionalidade, especialmente
em Hallelujah (Leonard Cohen), Crazy ( Seal), Viva La Vida (Coldplay). E de mais limitado alcance no pout pourri de música latina.
À base de uma boa composição
orquestral (sob comando de Yacoce Simões) reunindo cordas e sopros, com dez integrantes, paralela a uma banda
de composição mais roqueira (bateria, guitarra e teclados). Numa potencializada
concepção de luzes e cores (Irma Vidal/VJ Gabiru) conectando o psicodelismo de efeitos
luminares a estetizantes projeções 3D.
Onde o grande momento acaba sendo mesmo o de uma esperada rentrée no universo da ópera, nos pedidos do bis. Afinal, quase como uma espécie de recado para a volta ao gênero básico
que projetou Arancam além fronteiras. Com visceral brilho de tessitura vocal no Nessun Dorma e que, unindo seu energizado volume ao presencial
expressivo, culmina encerrando o espetáculo, numa cúmplice adesão palco/plateia.
Wagner Corrêa de Araújo
THIAGO ARANCAM - BELA PRIMAVERA - Pop/ópera show cenográfico. Em turnê nacional - BH, Curitiba, Rio de Janeiro, Salvador, SP. 120 Minutos Até novembro / 2018.
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