Há sempre uma grande polêmica quando a tecnologia compartilha com a
criação coreográfica. Até onde podem chegar os efeitos eletrônicos, entre a imagem e o
som, para manter íntegra esta relação corpo orgânico e corpo virtual
sem que a dança fique em segundo plano ou deixe de ser uma expressão artística
pura?
Ainda longe de nosso tempo de progressivo sistema virtual,
experiências iniciais foram realizadas entre os anos 60/70 por Alwin Nikolais Dance Theater com suas
inserções visuais que tornavam irreconhecíveis os bailarinos sob luzes,
projeções, figurinos e objetos, quais seres espaciais ou microrganismos.
Tal tendência, ao mesmo tempo que atraía, gerava protestos de
grande parte da crítica, público e artistas, pela perda do imanente caráter de
dança pela dança. Esta, então, exemplificada pela força inventiva e
vanguardista das criações, por exemplo, de Merce
Cunninghan que, aliado à música
concreta de John Cage, privilegiava o gestual coreográfico.
Outros grupos , como o Momix
, se tornaram protótipos desta tendência de integração da dança com os mais
ousados recursos digitais transformando corpos em silhuetas videográficas.
Numa perspectiva de sincronicidade, a cia. italiana Evolution Dance Theater vem apresentando
seus espetáculos de abolição de fronteiras entre dança, atletismo, ilusionismo,
ainda que este mix artístico, com seus superlativos efeitos cinéticos, não se
incline ao favorecimento total da criação coreográfica.
Onde, pelo dimensionamento cenográfico, o excesso de
manipulações imagéticas revela sua fragilidade quando o palco, em rápidas
passagens, desnudado de artifícios tecnológicos, revela bailarinos numa
gestualidade repetitiva, em atletismo rítmico e quase ginástico, sem grande
alcance expressivo como proposta dançante.
Por outro lado, pelo experimentalismo de linguagens, Night Garden, o seu mais recente espetáculo, nada mais faz que dar continuidade, reiterativa e sem nenhum avanço na valoração maior da dança, ao
anterior Firefly, aqui apresentado
em 2015.
Se chega a impressionar, ora como uma instalação plástica
performática, ora por sua nuance de celebração ritualística entre ciência física e dança, teatro de sombras e acrobacia circense, realismo e magia, insiste
na sua proposta de prevalência da tecnologia em detrimento de uma maior relevância
na estética coreográfica pura.
Embora seu próprio mentor/coreógrafo Anthony Heinl reconheça ali mais como um cruzamento de
linguagens cibernético/artísticas justificando,assim, este direcionamento
conceptivo:“a ausência de uma linguagem
específica imprime uma marca universal aos trabalhos”.
Na preferência por
quadros tecnocênicos que envolvam noite e escuridão que, por sua vez, facilitam
o jogo dos efeitos visuais entre sombras. Ainda que se transforme a fisicalidade de
seus integrantes, entre bailarinos e acrobatas, em meros esboços pictóricos.
O que só é quebrado em partes episódicas que, de forma
alguma, propiciam qualquer teor investigativo pela dança, num gestualismo mais próximo do
acrobático/circense que da autenticidade da criação coreográfica.
Na qual esta não seja apenas um dos elementos de sustentação
de um show de ilusionismo para os olhos, mas sem qualquer apelo para a estética
sensorial da contemporaneidade artística.
Capaz, aí sim, de provocar envolvência emotiva, por seu
direcionamento de energizada pulsão coreográfica contextualizada no substrato
de uma livre criatividade “high tech”.
Evolution Dance Theater- Night Garden está em cartaz no Theatro Municipal/RJ, nesta quarta e quinta, 17 e 18/10, às 20h. 90 minutos. Seguindo em temporada para São Paulo, Belo Horizonte, Curitiba e Salvador.
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