FOTOS/RENATO MANGOLIN |
Uma representação mimética da realidade da grande metrópole
com seus conflitos e sua agressividade comportamental cotidiana, capaz de transmutar o lúdico da convivência
comunitária em guerra diária, da qual sai vencedora, sempre, a marginalidade
que conduz ao crime.
Onde o aforismo literário roseano
- “viver é muito perigoso” – torna-se uma prevalente
lição de sobrevivência diante de um ameaçador status às mais coloquiais
posturas dia-a-dia. Turbando a aparente tranquilidade do estar só, falando ao
celular ou até acompanhado, não importa, num ponto de ônibus ou em qualquer esquina, e um assalto súbito
ter saldo de violência terminal.
Ou ser agredido moralmente pela proibitiva miserabilidade dos
muitos habitantes ao relento, entre traficantes, drogados, famintos e
aleijados, adultos ou menores, todos suprindo-se, em suas prementes carências, pelo escape de seus males com o atirar-se ao roubo.
Diante deste quadro de desalento e dor, Glaucy Fragoso, no tríplice oficio de atriz,
dramaturga e diretora, faz de Urbana
um singular espetáculo de reflexão sobre as adversidades da condição humana no contexto citadino, entre o
pânico e a poesia, do riso à melancolia.
Com sua vasta experiência nas incursões de atriz expertise em bufonaria, no circo e na rua, Glaucy Fragoso promove uma auto reflexão crítica sobre as personagens
retiradas dos logradouros públicos, em intimista conexão com a desordem social
dos espaços abertos da urbanidade.
No estabelecer com elas um jogo teatral, entre a representação e a veracidade, tornando-as similares àquelas
as quais, nós os habitantes metropolitanos, estamos acostumados a conviver, por bem
ou por mal.
Num ato de identificação viva com aqueles tipos que ora odiamos
por nos legarem o mal, ora num quase perdoar de suas faltas, pela patética
percepção de serem inescapáveis vítimas das
mazelas da sociedade.
E que são, aqui, vistas com uma nuance de comiseração pelo riso
de irônica piedade, assumido na envolvência de gestual acrobático/circense e de
mascaração burlesca, triste ou divertida, mas sempre questionadora, em incisiva performance.
Fruto de longa jornada em cias. tanto de teatro popular com o
substrato dos picadeiros e lonas, como das próprias vias urbanas, estas personificações estruturam-se
à base de minimalistas elementos cênicos, da indumentária básica (dividida na dupla concepção da atriz protagonista com Florência Santangelo) a incidentalizados acordes sonoros (André Ramos).
Nem sempre de comprovada eficácia no não cenário e no vazado desenho de luz (Guiga Ensá), na incompletude substitutiva de nos fazer evocar, como um ideário teatral de
assumida espontaneidade, a natural
ambiência dos espaços abertos da grande cidade.
Com inventivas saídas e alguns percalços numa reiterativa
progressão dramática, sujeita a ocasionais quedas na superficialidade,
apresentando soluções por vezes mais adequadas à autenticidade do teatro de rua
que ao palco italiano.
Como a grande falta que faz a proximidade cara a cara intérprete/espectador na exteriorização ao ar livre, implícita às possibilidades mais incisivas de sua proposta conceitual.
Como a grande falta que faz a proximidade cara a cara intérprete/espectador na exteriorização ao ar livre, implícita às possibilidades mais incisivas de sua proposta conceitual.
Mas, enfim, Urbana é espetáculo que, mesmo entre muros,
não deixando perder a sua reflexão ideológica, alcança a valoração do que
merece ser conferido por seu teor investigativo.
Wagner Corrêa de Araújo
URBANA está em cartaz na Fundição Progresso(Espaço Armazém), Lapa/RJ, sábado e domingo, às 19h30m. 65 minutos. Até 07 de outubro.
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