FOTOS/RENATO MANGOLIN |
Quando se esperava mais um musical biográfico onde as canções
serviriam de pretexto, “pra variar”, impulsionando
a progressão dramática , no formato
alterativo de fatos entremeados por acordes vocais e instrumentais, Gustavo
Gasparani surpreende com seu Zeca
Pagodinho-Uma História de Amor ao Samba.
Desta vez, fazendo uso de seu vasto dossiê de passagem
artística e existencial pelos terreiros, quintais e passarelas, para mostrar-se muito além do lídimo
conhecedor/lutador , de vida e de arte, pela nobre causa sambista , como o fez em SamBra após seus muitos carnavais.
Agora, na convergência quadrupla como
autor/ator/cantor/diretor, nesta outra incursão nas sagas da cultura popular
carioca, assumindo uma singular identificação psicofísica com o personagem
titular.
Precedido pela reveladora representação de Peter Brandão como
Jessé o moleque arteiro que induz à
personificação adulta do Zeca Pagodinho,
ora em solilóquios ora em paralelos cênicos.
E que vai se desincumbindo em sugestiva lembrança corpórea/afetiva , do
biografado criança às aproximativas marcações
assumidas, outrossim, por seu
correspondente na fase adulta(Gustavo Gasparani). Num metafórico significado pirandelliano com
postural verismo – eu sou eu, tu és tu,
nós não somos nós, somos ele.
E Ele, o Zeca, também participa deste lúdico jogo de
teatralidade ao surgir, via projeções, em depoimentos dialetais com sua dúplice
representatividade especular. Incitando, com interação irônica e cativante, à adesiva
cumplicidade palco/plateia.
A concepção cenográfica (Gringo Cardia) , com sua estética tropicalista
de aquarelado referencial pop/primitivista(em seus painéis de elementos
gráficos e de azulejaria), estende-se ao seu rompante figurino(Marcelo Olinto) de tons
carnavalescos/religiosos.
Que, no colorido compasso coreográfico de Renato Vieira, faz lembrar o teatro de
revista , gênero assumido pela montagem, ora com brilho ora com pequenos entraves na linha narrativa que, vez por outra, incorre em ligeiras obviedades na explanação temática.
O desenho de luz ( Paulo Cesar Medeiros) psicodeliza esquentando a imaginária suburbana com seus “Clóvis”, bate-bolas, sereias e São Jorges.
Ou na “santificação” humorada da dupla
Cosme e Damião, pela empática performance de Édio Nunes e Bruno Quixotte.
Anna Velloso, Beatriz Rabello, Douglas Vergueiro, Flávia
Santana, Lu Vieira, Milton Filho, Psé Diminuta, Ricardo Souzedo e Wladimir
Pinheiro completam numa funcionalidade quase coral , preenchendo com vozes, corporeidade
e muito swing, esta teatralidade de espontâneo carisma propugnado por seu criador mor (Gustavo Gasparani, com Cristiano Gualda, na codireção).
Que , ao lado de um élan musical de apelo popular, no enérgico desempenho do naipe do quinteto instrumental de João
Callado e seus contagiantes arranjos, conclama a cada espectador - vai vadiar. E quanto a vida , deixa esta te levar...
Wagner Corrêa de Araújo
ZECA PAGODINHO-UMA HISTÓRIA DE AMOR AO SAMBA está em cartaz no Theatro Net Rio/Copacabana, quinta e sexta, às 21h;sábado, às 17h30m e às 21h;domingo, às 20h. 120 minutos. Até 29 de outubro.