Cristina 1300 - Affonso Ávila Homem ao Termo. Eleonora Santa Rosa / Direção, concepção e roteiro. Dezembro /2024. Filme / Foto Divulgação. |
O poeta, ensaísta e pesquisador do Barroco, o mineiro Affonso
Ávila é tema de um incisivo filme documentário, sob ideário, roteiro e direção
de Eleonora Santa Rosa, que em noite prestigiada no Estação Botafogo,
finalmente estreou no RJ, depois de BH, Ouro Preto, São Paulo, seguindo para
outras capitais, com previsões no exterior.
O filme traz uma linguagem inovadora para os habituais documentários
sobre literatura dando, em caráter prioritário, a palavra ao próprio poeta para
falar sobre sua obra em importantes registros opinativos sob o formato de auto-depoimentos,
gravados e filmados com o escritor.
Além da proposta de não só ouvir a sua palavra personalista, mas também de mostrar, em plásticas composições gráficas e virtuais, a textualidade dos seus poemas, considerados da maior simbologia como expressão de uma revolução estética na poesia brasileira.
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Affonso Ávila fez parte de fundamentais movimentos literários
a partir dos anos 50, desde a revista Tendência
às suas colaborações participativas no Concretismo, através da publicação
paulista - Invenção - onde atuou ao
lado de outros nomes básicos que revolucionaram o modo de ver e de sentir o
ofício poético, com um olhar sempre armado na contemporaneidade.
Com uma vasta bibliografia, em livros publicados indo da
poesia ao ensaio literário, além de ser considerado uma autoridade na pesquisa
e na valoração do Barroco Mineiro que o tornou um marco, tanto no seu discurso
analítico do movimento sob todas as suas derivações, como nos seus
reflexos trans temporais na arte e na
cultura brasileira.
Uma exibição mais que afetiva, como sobrinho do casal de
poetas Affonso Ávila e Laís Corrêa de Araújo, com os quais passei dois
memoráveis anos adolescentes, em anos turbulentos e obscuros pós implantação da
ditadura militar, 1965/66, exatamente no icônico endereço Rua Cristina,1300
para completar o Curso Clássico na quase vizinha Faculdade de Filosofia da
UFMG.
Ressaltando ser ali, naquela casa, um quase obrigatório ponto de encontro
para a intelectualidade mineira e para escritores além-horizontes das Gerais.
Um delírio presencial, só no curto período de convivência familiar com o
estimado casal e filhos (a maioria tornada de poetas a artistas).
Imaginem o encantamento, para um inquieto espírito de alguém
entre 16/17 anos, ver e ouvir de perto Murilo Rubião ou Murilo Mendes, e até o
francês Michel Butor, entre tantos outros da antiga e da novíssima geração,
Adão Ventura, Sérgio Santana, Luís Vilela e por aí vai.
Onde, esta noite de exibição representou uma proustiana
viagem no tempo, recheada com um sotaque roseano de mineiridade. Completada no
reencontro de um dos amigos jovens daquela época de busca e de revelação
vocacional, caso de talentos artísticos como o do hoje conceituado nome da
criação plástica brasileira Angelo Marzano.
E também pela presença do reconhecido poeta, escritor e
tradutor apurado, crítico e ensaísta Julio Castañon Guimarães que tive o prazer
de conhecer em tempos posteriores, nos meios acadêmicos-universitários
juizdeforanos, ainda no final dos anos sessenta. Ambos, aqui, no uso da palavra
certa na hora certa, na mesa de debates depois do filme, coordenada por sua
convicta diretora - Eleonora Santa Rosa.
A responsável por esta sessão fílmica de tanta empatia e
mergulho sensorial proporcionados, simultaneamente, pela conexão da luminosidade do legado de um poeta maior, com
a magia autoral de um filme, incluída a participação da voz carismática da
atriz Vera Holtz na leitura em off dos poemas, tudo, enfim, nos levando a uma
emotiva trajetória memorial nos espaços siderais da mente...
Wagner
Corrêa de Araújo
Cristina 1300 - Affonso Ávila Homem ao Termo. Estação NET Botafogo, 04/12/2024. Da esquerda
para a direita, Vera Holtz, Angelo Marzano, Wagner Corrêa de Araújo, Eleonora
Santa Rosa e Júlio Castañon Guimarães.