"IN EXTREMIS" OU O DESTINO EM SUAS MÃOS

FOTO BY HEMERSON CELTIC

“Amo as superstições . Elas são a aquarela do pensamento e da imaginação. São as opositoras do bom senso. E o bom senso é inimigo da fantasia”.

Palavras esclarecedoras de Oscar Wilde que nunca escondeu seu fascínio pela paranormalidade, pelo sobrenatural e pelo misticismo. Numa de suas idas a uma cartomante em Paris foi surpreendido com uma estranha previsão “pela linha de sua vida, você morreu dois anos atrás”.

Na noite de 24 de março de 1895, há apenas uma semana dos fatos que o levariam à derrocada literária e existencial sob a acusação, do pai de seu jovem  amante  Lord Alfred Douglas, de  “ cometer atos imorais com diversos rapazes”, Wilde se encontra com Miss Robinson, uma quiromante famosa em Londres.

Não atendendo aos apelos de amigos e admiradores de que deveria imediatamente abandonar a Inglaterra, deixa se iludir pela leitura das linhas de suas mãos  - “um triunfo”. E é a partir deste fato que o conceituado dramaturgo  inglês Neil Bartlett traça o enredo simbolista de sua peça “In Extremis”.

Na sua concepção , mais ousada que o original britânico, o tradutor e diretor Bruno Guida subverte a caracterização masculina dos personagens, em instigante arquitetura cênica(Flávio Tolezani).

Onde a exorbitância de figurinos de brilho decadentista ( Daniel Infantini ) potencializa o clima grotesco,entre a narrativa fantasiosa e o humor negro. Acentuado com a luz entre sombras ( Aline Santini) e o sotaque gótico do score sonoro( Daniel Maia).

Mas o que é levado literalmente “ in extremis” é o confronto da exponencial performance próxima da bufonaria. Aqui   a impudência cínica da vidente Mrs Robinson( Daniel Infantini) se impõe, em ambiência fantasmagórica pós-tumular,  à vulnerabilidade solitária de Oscar Wilde ( Flavio Tolezani).

Enquanto  a cartomante (Infantini)assume um original histrionismo charlatanesco(extrapolado, às vezes, em sua histeria), a reflexiva introspecção do frio e amargurado personagem / escritor(Tolezani) aparece na citação de passagens literárias do próprio Wilde.

A condução cênica ( Bruno Guida) , com seu referencial de obscuridade e perversão, tem um envolvente apelo  tanto na proposital decrepitude de seu barroquismo, como na mordaz exposição da sabedoria e da loucura do hedonismo sob o fio da navalha.

Ou , talvez, pelas linhas amargas do "De Profundis" ,é  como se,  aqui,  estivéssemos mimetizando Oscar  Wilde nos seus encontros secretos e de risco:

“Era como estar numa festa com leopardos. O perigo era parte da excitação .Eles tinham para mim o brilho das serpentes douradas. E o veneno era parte de sua perfeição”.



( IN EXTREMIS está em cartaz no Teatro Poeirinha,Botafogo, terças e quartas, 21h. Até o dia 28/0utubro)




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