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Ainda , em pleno século XXI, recebendo uma classificação diagnóstica de distúrbio medicinal, a postura do ser transexual é exteriorizada no pertencimento temporário a uma genitália que não é a de sua original fisicalidade biológica.
E , assim, no discurso
do travestismo prevalece a auto estima na atitude afirmativa de sua intrínseca sexualidade.
Conceitualizada na alteridade erótico/afetiva do
comportamento cotidiano e no enfrentamento
corajoso da dor e do desconforto de um
destino de exclusão.
Num percurso ácido desde os anos de bullying psicológico – familiar, escolar e
profissional – aos riscos existenciais dos malefícios físicos , suicidas e assassinos.
Nesta retomada da questão transexual, Silvero Pereira, como
ator, autor e diretor desnuda-se outra vez como travesti, tendo como mote inspirador
um texto ficcional de Caio Fernando Abreu ( Dama
da Noite) para titular o solilóquio dramatúrgico – “Uma Flor de Dama”.
Numa cronologia narrativa noite a dentro, três elementos cenográficos
são auto referenciais no vir a ser da travessia transgênica do ator/personagem. Um camarim onde
ele se monta,burlescamente, com as vestes designativas do feminino e no mascarar–se
em visagismo de ambivalente anatomia genética.
Em tempo de tráfico como objeto de desejo sexual transgressor,
na ostentação debochada da representação
transformista e no desafio afirmativo da prostituição pública .
A madrugada, de ferino desabafo e amarga rebeldia, numa mesa de
bar com um imaginário cliente/espectador de inusitados fetiches sensuais transmutados,
metaforicamente, na rejeição ou na cumplicidade silenciosa da plateia.
E o retorno , na solidão de um vaso sanitário domiciliar, ao
seu eu hormonal na constância de um jogo fantasmagórico dos contrários, onde se
pode ser sempre macho mesmo dando como fêmea.
Onde a contundência das falas desbocadas, a afetação e a agressividade
gestual, o kitsch risível e a
espontaneidade irreverente da
performance de Silvero Pereira tornam Uma
Flor de Dama uma experiência estimulante.
Na qual, enfim, é impossível
ficar insensível ao desagrado e ao
desagravo de suas verdades.
Wagner Corrêa de Araújo
UMA FLOR DE DAMA está em cartaz no Teatro Poeira/Botafogo, de quinta a sábado, 21h;domingo,às 19h. 60 minutos. Até 19 de fevereiro.
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