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FOTOS/BRUNNO DANTAS |
“Reformar o mundo quer
dizer reformar a educação”. Este já era o lema do professor, médico e escritor polonês Janusz Korczack(1878-1942), antecipando os futuros avanços da chamada nova
pedagogia, e que teve, entre seus ilustres seguidores, o suiço Jean Piaget e o nosso Paulo Freire.
Durante quase três décadas administrou e viabilizou a prática de seu ideário a favor da infância desamparada no exemplar orfanato fundado em 1912
e que lhe foi arrestado pelos nazistas logo após a invasão da Polônia, obrigando-o
a transferir suas duas centenas de crianças judias para as insalubres
instalações do Gueto de Varsóvia.
Mesmo assim, ele se esforçou, no entremeio de uma luta insana,
a defender seus pequenos mantendo acesa a chama da democracia micro cósmica, estabelecida e partilhada entre eles. Modelar em sua singularidade mas
especular a uma organização politico/social adulta, com direito a um sistema
parlamentar e jurídico, com seu próprio
código comportamental altruísta e suas punições, estas sempre com intuitos
catárticos.
Sua trajetória já inspirou dois renomados cineastas – o
alemão Aleksander Korda e o polonês Andrzej
Wajda – a partir do legado de suas obras, ora pelo confronto ao prevalente antissemitismo
da época, ora pela exposição de suas teorias educacionais a favor da dignidade humana. E, agora, através de particularizada
textualidade dramatúrgica de Miriam Halfim, em provocativo e reflexivo comando
diretorial de Ary Coslov e surpreendente performance de Marcelo Aquino.
Com uma narrativa não necessariamente linear, o personagem
vai rememorando momentos existenciais numa sequencial alusão ao seu passado, à sua breve experiência como oficial do exército pátrio, ao seu projeto pedagógico
e ao seu códice geral de vida.
Expositivo em seus escritos, especialmente nos seus Diários, emotivamente contextualizados
em teatralidade de enunciativas vocalizações e energizadas gestualizações (Ana Vitória), sob poética e pânica
mascaração da dor e da violência.
Com um adequado recato cenográfico (Ary Coslov) à base das mutabilidades plásticas de uma cadeira e uma
mesa, num palco emoldurado frontalmente com um telão que visualiza fotografias
familiares e dos órfãos. Além de filmes documentários sobre as perversidades da solução final no projeto nazista.
Conectando-se sempre à absoluta convergência focal ator>público para fluência maior
da pulsão drama>catarse.
Sob estetizados tableaux sonoros (A.Coslov) habilmente privilegiando
melancolizados acordes e cantares
tradicionais judaicos, entre sensoriais marcações luminares (Paulo Cesar
Medeiros), o ator protagonista Marcelo
Aquino assume convicta veemência na exposição vocal/física de uma tragédia
terminal anunciada.
Acentuadamente previsível na referência à representação patética de uma peça de Rabindranath Tagore, em torno da iminente inescapabilidade da morte de uma criança, e na paisagem mágica das nuvens, insinuada através das frestas do soturno vagão de carga animal que conduz o professor e seus "duzentos filhos" para o implacável destino crematório de Treblinka.
Acentuadamente previsível na referência à representação patética de uma peça de Rabindranath Tagore, em torno da iminente inescapabilidade da morte de uma criança, e na paisagem mágica das nuvens, insinuada através das frestas do soturno vagão de carga animal que conduz o professor e seus "duzentos filhos" para o implacável destino crematório de Treblinka.
Numa tessitura ritualística artaudiana, fazendo entender sua transposição cênica pela orgânica simbolização
de visceral intimismo psicológico, sintonizado em transe externo, com tal substrato verista em torno da crueldade humana que impacta o mais acomodado e desentorpece
o mais alheio espectador.
Wagner Corrêa de Araújo
MEUS DUZENTOS FILHOS está em cartaz no Centro Cultural da
Justiça Federal, Cinelândia/RJ, de sexta a domingo, às 19h. 60 minutos. Até 23
de setembro.
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