FOTOS/LUCIO LUNA/EMMANUELLE BERNARD |
No alvorecer do século XX, dois jovens artistas dinamarqueses
decidem se unir em matrimonio , compartilhando suas tendências artísticas –
ambos eram pintores (Einer Wegener
em paisagens e Gerda Gottlieb
com seus retratos) – e seus desejos afetivos.
Um dia, na ausência de uma das modelos da artista, Einer ocupa seu lugar travestido com uma indumentária feminina. Mas a inocente experiência desperta fantasias homoeróticos e, a partir daí, sua insistência em poses é transmutada num ato de irreversível paixão.
E de compulsiva diversão, ora em
bailes ora em footings, confundindo-se sempre, nestes trajes e na companhia de Gerda, como se duas amigas fossem. . Até que seus furtivos flertes com rapazes , ainda que
sublimados pela feliz convivência da mútua criação plástica, o levassem à
definitiva opção sexual.
Em anos ainda incólumes à preconceituosa onda moral nazista, Einer, já como Lili Elbe, participa das primeiras cirurgias transexuais,
incentivadas pelas teorias libertárias do sexólogo alemão Magnus Hirschfeld, mas os promissores resultados iniciais tem um
trágico epílogo .
Depois do romance ( de David
Ebbershoff) e do filme de Tom Hooper( Garota Dinamarquesa) , o
tema chega ao teatro , com um lastro maior nos Diários de Lili Elbe, pela dramaturgia de Walter Daguerre e na direção de Susana Ribeiro, sob a
titularidade de Lili.
Numa preciosa estetização de uma corajosa aventura humana,
pelo alcance afirmativo, através da arte, da liberdade de expressão das sexualidades reprimidas , Elbe ( Darwin Del Fabro) e Gerda( Suzana Castelo) se
entregam aos personagens com uma cativante performance .
Com suas presenças irradiadas em cada gesto, entre nuances
dramático/coreográficas, em sensível e vigorosa direção de movimento( Renato
Vieira), o casal assume um raro dimensionamento psicológico, entre a
introspectividade e a envolvência sensorial.
Ela na irônica aceitação da incerteza futura das suas relações amorosas, ele cônscio da superação e desfecho de seus conflitos eróticos, estabelecem , assim, imediata empatia com a platéia.
Na minimalista concepção cenográfica(Beli Araújo) com um referencial
plástico a Lygia Pape, fios e cortinas transparentes se transformam em
véus/pinturas. Conectando-se à elegância sensual dos figurinos(Antônio Medeiros)
e à fluente musicalidade ( Ricco Vianna), sob luzes ( Rodrigo Belay) entre sombras, cores e
claridades.
O comando diretorial ( Susana Ribeiro) acentua o equilíbrio da
expressão verbal e da linguagem corporal, numa gramática cênica de envolvente
contraponto entre o emocional interiorizado e os tensos reflexos da ação física de troca genética e de similaridade do desejo erótico.
Apaixonante enquanto expõe ,com delírio e verismo, artistas e
personagens, Lili tem, em sua teatralidade textual e cênica, o impacto de uma
pintura de beleza e desalento e de um irreverente poema coreográfico, de sincera e instintiva pulsão à prevalência das vontades e segredos de nossas díspares sexualidades.
LILI está em cartaz no Espaço Sesc/Copacabana, sexta às 21h; sábado e domingo, às 18h.75 minutos. Até 20 de novembro.
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