Há quase um século, desde o despertar cinematográfico, Charles Chaplin, imbatível misto de ator,
comediante, acrobata, músico e dançarino, domina corações e mentes, fascina
crianças e poetas:
“O mito cresce, Chaplin, a nossos olhos feridos do pesadelo
cotidiano”(Carlos Drummond de Andrade).
Inspirado numa idealização textual e criação dramatúrgica/vocal de Christopher Curtis, com libreto de Thomas Meehan, “Chaplin, O
Musical“ estreou na Broadway em 2012, no entremeio de polemizada e controversa receptividade crítica.
A montagem brasileira retoma a visão cenográfica de Matt Kilney, sob o comando diretor do argentino Mariano Detry, a direção musical de Marconi Araújo e a tradução
e adaptação por Miguel Falabella.
Em sua trama dramático/musical de conduto linear/cronológico, apresenta,
em seu primeiro ato, o East End de
Londres, na virada do século XIX, com seus tipos de rua, onde o pequeno Charles
tem com a égide materna (Naíma) um aprendizado de artes circenses e variedades.
Do ambiente music hall
europeu, junto ao irmão Sidney (Juan
Alba), Chaplin(Jarbas Homem de
Mello), já na América, faz ali sua estreia, como ator de cinema mudo, nas comédias curtas de Mack Sennet (Paulo Goulart Filho).
E é, então, num crescendo, que o espetáculo tem propícia
envolvência, em seu mix criativo de teatro/cinema e sua unificação de
personagens/projeções fílmicas, com as intervenções do empresário Fred Karno, em adequada representação
por Julio Assad.
De especial contextualização no mimético apropriar-se do
personagem Carlitos e do potencial apelo estético na pantomímica coreografia,
inspirada no múltiplo desdobrar-se da clássica figura imaginária do vagabundo,
sua cartola e sua bengala.
No segundo ato, os conflitos pessoais/biográficos do
cineasta/ator, em detrimento do aprofundar-se em torno da sua personalidade
artística, ocasionam sensível perda da progressão narrativa, perceptível em charmosa reiteração da fantasia e do lendário
de um legado na inicialização da proposta cênica.
Há, assim, apenas um maior referencial em torno de O Grande Ditador, que conduz à difamação
político/moral através do depoimento acusador da atriz Hedda Hooper(por Helga Nemeczyk). Com alterativo referencial ao relacionamento com a sua quarta mulher Oona
O'Neill, na superlativa vocalização de Myra Ruiz configurando marcante passagem do espetáculo.
A trilha original(sob responsabilidade musical de Marconi
Araújo), em sua fria convencionalidade melódica e de arranjos, faz sentir a ausência de alguns dos grandes
temas do Chaplin compositor como “Smile”.
Mas o cuidadoso design cênico de época (Matt Kinley), extensivel aos
figurinos (Fábio Namatame) e à coreografia(Alonso Barros), com segmentos de danças
populares e da cena cabaret/vaudeville, traz uma
acertada compensação, ressaltada também em apurado desenho de luzes ambientalistas
(Drika Matheus).
Enquanto o elenco, coeso, mantem qualificativo equilíbrio,
diante do exponencial favorecimento do personagem título em detrimento do significado minorizado, às
vezes, até mesmo de alguns dos papéis coadjuvantes mas com caracteres primordiais na teatralização de uma trajetória com antológico sequencial de arte e de vida.
Capaz, sobremaneira, na convicta personificação de Jarbas Homem de Mello, com artesanal entrega ao protagonismo, no contraponto critico entre o sensorial e o estético, de fazer prevalecer o mítico Chaplin, na emocional e inventiva dicotomia do homem e do artista, do criador e da criatura.
Wagner
Corrêa de Araújo
CHAPLIN – O MUSICAL está em cartaz no Espaço Teatral/Complexo Cultural Ohtake/Pinheiros/SP, quinta e sexta, às 21h; sábado às 17 e às 21h; domingo, às 18h. 150
minutos. Até 16 de setembro.
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