FOTOS BY MAURO KURY |
No delineamento das relações entre a música e as artes cênicas e visuais, o mais referencial resultado é,certamente, a obra descritiva de Modest
Mussorgsky – Quadros de Uma Exposição
. Composição em que ele traça um retrato afetivo de um artista russo Victor Alexandrovitch
Hartmann, através de dez quadros pianísticos, após sua súbita e precoce morte, em 1874.
E é , ainda, nesta
trilha formalista , o rastro multifacetado do compositor John Cage
quando diz: “Tudo o que fazemos é
música... Há teatro todo o tempo, onde estejamos. E a arte não faz senão ajudar a nos persuadir disto”.
Neste elo singular de
confronto de linguagens criadoras, em Inútil
a Chuva, a dramaturgia de Paulo
de Moraes e Jopa Moraes, impulsiona, sonoro/visualmente, o auto-retrato, também,
de um pintor. De intrigante
ausência, após uma carta de despedida,legando um inquisitivo eco
familiar– suicídio ou morte acidental?
E a narrativa textual recria, assim, cenicamente , oito de seus quadros , numa inspirada
transposição tela/palco, em que as passagens plásticas se confundem com a trajetória dos personagens .
Como a viúva Lotta(Patrícia Selonk)e seus três filhos – Slavoj(Leonardo Hinckel), Claude ( Tomás Braune) e Sarah(Andressa Lameu) ,desde a inicial e simbológica figuração de um barco nas torrentes de um rio. Nas translúcidas cores das taças de um baile ou no muralismo de uma janela envidraçada.
Como a viúva Lotta(Patrícia Selonk)e seus três filhos – Slavoj(Leonardo Hinckel), Claude ( Tomás Braune) e Sarah(Andressa Lameu) ,desde a inicial e simbológica figuração de um barco nas torrentes de um rio. Nas translúcidas cores das taças de um baile ou no muralismo de uma janela envidraçada.
Além das interferências de uma jornalista Vivian ( Amanda
Mirasci) que ,na sua investigativa escrita sobre o misterioso caso, encontra o
matemático e conhecedor do morto, Matthias( Marcos Martins).
Esta configuração teatral / pictórica se transforma numa pintura viva , em contrastantes paisagens cênicas que visualmente remetem a quadros específicos de uma
vernissage, capazes de estimulantes sensações, como os acordes de Mussorgsky.
Ora através da
ressonância do score musical ao vivo(Ricco Viana/Rafael Tavares), ora nos
estados de espírito provocados pelas sutilezas luminárias (Maneco Quinderé). Ou no pincelamento dos figurinos (Rita Murtinho) e no impacto aquarelado da arquitetura
cenográfica(Paulo de Moraes/Carla Berri).
Embora o enredo dramatúrgico torne-se , às vezes, abstrato e irregular
diante da prevalente virtualidade plástica e de um
discurso acentuadamente fragmentário , em torno deste núcleo familiar metaforicamente caotizado .
Ainda que os caracteres de personalização sejam bem
delineados na convicção matriarcal de Lotta, nas incertezas de Slavoj, nas provocações de Claude e
Sarah, nas dúvidas de Vivian , na
espontaneidade de Matthias.
Mas onde ,mesmo com este visível confronto entre o teor
dramático e a imanente estética visual, está
presente a habitual contundência e não faltam as rédeas firmes de Paulo de Moraes , reiterando a permanência transcendente da Armazém Cia de Teatro.
INÚTIL A CHUVA está em cartaz na Fundição Progresso, Lapa/RJ, de quinta a domingo, às 20 h. Até 20 de dezembro.
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