Num tempo além do tempo, em subversão cronológica, um trio
mítico grego( Laio,Jocasta,Crísipo) ,ligado por uma visceral paixão erótica, se
encontra num destes recantos baratos de prostituição. No desfrute do prazer
pelo mero prazer ,mas imunes ao signo da maldição que os marcou na
ancestralidade , novamente vivem os impulsos sexuais que os conduzira, em
cronometragem milenar , ao fato trágico, entre a Frígia e Tebas.
Mas ,desta vez, o rei Laio(o pai assassinado no acaso da
fatalidade de Édipo) divide simultaneamente os gozos seminais entre a rainha
Jocasta e o jovem príncipe Crísipo, do qual fora preceptor indicado por outro
rei, Pélops.Missão que nos idos relatos lendários, entre aulas de lutas
marciais e lições filosóficas, conduzira a uma vertiginosa atração
homoafetiva(Laio/Crisipo), a primeira registrada nos anais greco/mitológicos.
Pedro Kosovski , o autor de “ Laio e Crísipo”, já enveredara
no explorado lastro edipiano em "Edypop", mas, agora, superando as
fragilidades do texto antecedente. Com sua pegada experimental num mix de
linguagens estéticas, o dramaturgo novamente faz uso de elementos pop/urbanos
nesta re-contextualização do mito ,entre o poético e o trágico,com superlativa
carga de sensualidade
Sua original abordagem traz ,ao dúplice desejo copular de
Laio, um componente inédito ao incorporar Jocasta, neste metafórico “ménage a
trois”, na contemporaneidade de um “inferninho” . E nesta nuance revisionista
da narrativa historicamente estabelecida atinge sua personificação, se
aproximando da melhor vertente de modernas releituras da tragédia grega .
Dando ressonância inventiva à proposta da direção de Marco
André Nunes, uma impecável arquitetura cênica, na cenografia (Aurora dos
Campos),nos figurinos(Marcelo Marques) ,na iluminação(Renato Machado)e na
incisiva reverberação da trilha sonora ao vivo(Felipe Storino).
O enérgico gestual( Marcia Rubin) do elenco, em exponencial
performance, extrapola os limites da eroticidade no domínio atlético de
Laio(Erom Cordeiro), na entrega juvenil de Crísispo(Ravel Andrade) e na
liberação comportamental de Jocasta(Carolina Ferman).
Na transgressão do mito original , na transcendência de
épocas, na impunidade da culpa pelo prazer orgiástico de seus personagens, a
peça ,no seu questionamento estético/moral, acaba assumindo o desafio da
reinterpretação do simbológico conceito de Sófocles sobre seu mais célebre
rival tragediógrafo:
“Eu pinto os homens como eles deveriam ser; Eurípides os
pinta como eles são”.
LAIO E CRÍSIPO está em cartaz no Teatro Glauce Rocha/ Centro / RJ, sexta a domingo, 19h. 80 minutos . Até 29 de Janeiro.
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