Teatro Poeira - 15 Anos. Janeiro 2022. Fotos/Nil Caniné. |
Interrompido pelo surto pandêmico, o tributo comemorativo dos
15 anos de ininterrupta atuação do Teatro
Poeira, no belo ideário original de uma dúplice e valiosa parceria das
atrizes Andrea Beltrão e Marieta Severo, aconteceu, então, de uma forma diferencial :
uma mostra em formato simultâneo de instalação plástica e performática
concebida por Bia Lessa.
Inaugurada no início deste ano a exposição deve ser encerrada
no final deste mês de março, tendo se tornado absolutamente obrigatória para
todos os que amam o universo teatral, especialmente nestes tempos tão adversos
da parte de uma (des)governança de assumido descaso à criação cultural
brasileira.
O percurso, de mais ou menos uma hora, pelos bastidores dos
dois espaços (Poeira e Poeirinha) completada por uma
performance virtual e outra ao vivo, é um merecido registro do legado de tantos
criadores, a maioria deles ainda em permanente atuação, não só nesta década e
meia da singular trajetória do Teatro Poeira.
Mas, em abrangência mais que especial, na sua
representatividade não só nos anais do teatro brasileiro mas, sobretudo, de resistência e de resiliência diante do
retrocesso obscurantista como é conduzida hoje nossa política cultural. Sob mãos gestoras incapacitadas por sua
postura tosca e visão medíocre da importância do processo artístico, como necessário
ao próprio conceitual formador de cidadania e de nacionalidade do país.
Além das montagens antológicas do repertório brasileiro e
internacional, com muitas delas estreando em palcos brasileiros nos espaços
teatrais do Poeira e do Poeirinha, ali sempre foi habitual o incentivo às artes cênicas por intermédio
de cursos, workshops e oficinas.
Diante de tudo isto, o projeto concepcional de Bia Lessa mais
uma vez, surpreende por sua inventividade na conexão plástica/cênica, desvendando
bastidores como coxias, camarins e áreas técnicas, com interferências interativas
tanto na superfície como na envolvência da surpresa de nichos e gavetas nos
camarins.
Teatro Poeira - 15 anos. Andrea Beltrão/Marieta Severo/Bia Lessa. Janeiro 2022. Fotos/Nil Caniné. |
No Poeirinha, numa retomada referencial da reforma arquitetônica através da simulação
sugestiva de andaimes, ilustrada por vídeos com depoimentos elucidativos.
Cobertos por fotos das montagens ali acontecidas, entremeadas por frases
emblemáticas de Antonin Artaud a Peter Brook, de Nelson Rodrigues a Zé
Celso Martinez, sem esquecer outro de seus fundamentais idealizadores - Aderbal
Freire-Filho.
Com uma sequencial citação vocalizada de todos os nomes artísticos e técnicos envolvidos com
mais de uma centena de peças ali apresentadas, incitando uma forte emoção estética/reflexiva,
enquanto se ouvem acordes composicionais de obras simbólicas como o introspectivo Adágio para
Cordas, de Samuel Barber.
Direcionando-se tudo a dois momentos de transcendente simbologia, ora numa performance cinética/virtual com a participação das mentoras do incrível
projeto Teatro Poeira - Andrea Beltrão e Marieta Severo, ora numa representação presencial de
um quinteto de jovens atores.
Desta vez no Poeirinha,
manipulando pás, baldes e vassouras sobre montes de areias que se transformam
em névoas aéreas, metaforizando a titularidade do espaço, a partir da tradição do
chamado “cinema poeira”. Para o espectador, este caráter lúdico da exposição configurando sua convocação participativa numa obra aberta (segundo o pensar de Umberto
Eco) e, enfim, inserida no próprio vir a ser do teatro.
Ampliada sensorialmente naqueles que atuam como críticos e
jurados de prêmios teatrais, onde cada uma daquelas fotos ou frases, cada um daqueles
espaços ambientais da caixa cênica aos bastidores, representou um momento de pulsão
provocadora em seu oficio analítico, tal como uma viagem memorial pelos espaços siderais
da mente conduzida, em compasso de magia, pela vida que é sonho e que é teatro...
Wagner Corrêa de Araújo
Teatro Poeira – 15 Anos está em cartaz, de quinta a domingo,
em horários diversos, até 27 de março. Com senha grátis através de agendamento
no Sympla.
Nenhum comentário:
Postar um comentário