FOTOS/DALTON VALÉRIO |
Se as lutas emancipatórias pela causa LGBT tiveram sua inicialização
mais efetiva a partir do final dos anos 60, tendo sofrido sempre os reveses do
preconceito ampliado com o estigma da AIDS, o reconhecimento jurídico do
casamento gay só começou tardiamente com a iniciativa holandesa de 2008.
Que, ainda enfrentando os percalços do conservadorismo social
e da moral religiosa, vem lentamente se tornando um fato concreto, inclusive no
Brasil onde começa a ser aceito mas ainda não gerou nenhuma mudança mais
radical tanto no plano constitucional quanto no Código Civil. Tendo se tornado
uma conquista mais pela sua prática constante que por sua não proibitividade, sem estar explicitamente declarada
em dispositivo legislativo.
Ainda assim, aos poucos, vem se estendendo na sua conquista
cidadã de regras iguais, sem distinção de relacionamento sexual, em casos de
sucessão, usufruto, adoção, benefícios previdenciários, direito de
nacionalidade, entre outras ações. Mas apesar destas vitórias, à custa de muitas lutas, ainda
prevalece neste ringue o enfrentamento das regressões político/governamentais e de
significativa ala de resistência pelo favorecimento evangélico apenas da
procriação entre sexos diferentes.
Nesta última década, o tema da diferenciada orientação da sexualidade
vem se expandindo, mesmo sob perceptível referencial subliminar, tanto no
cinema, como no teatro e na televisão, e com maior ousadia no registro postural
e afirmativo, entre prós e contras, das redes virtuais.
Fugindo de uma abordagem que privilegiasse os estereótipos da
vida gay entre casais no convívio estável, a peça 40 Anos Esta Noite teve um tratamento temático hábil, partindo de
uma idealização de Gisela de Castro, onde seu jovem autor Felipe Cabral (que
também atua no espetáculo), imprime a fluência de tom bem humorado mas superativo de qualquer superficialismo comportamental e carência ideológica.
Numa narrativa coloquial, entre lembranças da trajetória de vida, conotações familiares e
de alternativa sexualidade, passionalidade e amenidades afetivas, num jantar
comemorativo do aniversário de quarenta anos de Gabriela (Gisela de Castro) organizado junto de sua companheira Clarice (Karina Ramil). Onde só destoa a
discursividade e o dispensável didatismo de cena sobre a simbologia da bandeira
arco íris na comunidade LGBT.
Tendo como convidado o casal formado por Bernardo (Gabriel Albuquerque) e seu recente namorado João (Felipe Cabral). Mas causando, enfim, iminente crise de
ciúmes para os respectivos consortes feminino e masculino, a irreverente ideia de uma gravidez provocada da aniversariante
em parceria com seu melhor amigo (Bernardo), visando suprir fracassadas
tentativas de inseminação artificial.
Contando com o suporte de um energizado quarteto atoral fazendo
os dois casais homoafetivos, sabendo imprimir espontâneos recursos histriônicos
e dramáticos longe de virtuosismos supérfluos, em performances bem delineadas
para uma representação de convicta unicidade.
Sob um desenho de luz climático (Russinho), figurinos extrovertidos
(Carol Lobato) e envolvente trilha incidental (Kleiton Ramil), inseridos em paisagem cênica (Fernando Mello da Costa)
sugestionando uma comunicativa decoraçao da sala destinada à festa natalícia.
Com um sempre exponencial e revelador comando diretorial
de Bruce Gomlevsky na pesquisa investigativa de novas soluções dramatúrgicas. Conduzindo,
outrossim, a nuance risível de uma comédia a um contextual reflexivo, de absoluto propósito para um inseguro
momento de atitudes obscurantistas, capazes de conturbar e interferir perigosamente
na vida privada de cada cidadão.
Wagner Corrêa de Araújo
40 ANOS ESTA NOITE está em cartaz no Teatro Ipanema, sábado,
às 21h; domingo e segunda, às 20h. 90 minutos. Até 25 de fevereiro.
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