FOTOS/ MARIANA BASSOUL |
“Meu dever, meu sagrado
dever é em relação a mim mesma”. As palavras finais de
Nora se tornaram carismáticas na luta pela emancipação da mulher e por sua
busca pela equiparação com os direitos
masculinos.
Desde sua estreia em 1879, quando deflagrou o início de uma revolução moral e social em meio à censura e
protestos, Casa de Bonecas, de
Henrik Ibsen, antecipou , com seus anseios libertários, outro célebre
personagem feminino do dramaturgo – Hedda
Gabler (1890).
Mas se para Hedda a
única saída é a do suicídio, a rebeldia
de Nora se prolonga, no abandono do lar, do marido e dos filhos, com a busca de
novas perspectivas e contra a mesmice das conveniências domésticas.
E é a densidade psicológica de um drama interior de opressão
da protagonista feminina que é refletido
até a contemporaneidade, com a persistência de um lastro ancestral de reclusão da mulher nos
limites intransponíveis das funções exclusivas de esposa e de mãe.
A versão do teatrólogo argentino Daniel Veronese, denominada
como “El Desarrollo de la Civilización
Venidera”, procura retomar o tema com
o olhar armado nos embates sociais de nossos dias . Onde, ainda, são possíveis muitas
“Noras”, impedidas de irem à luta pela resistência de preconceitos centenários.
Se esta Casa de Bonecas ( a versão brasileira retoma
o título clássico) é uma cópia narrativa quase perfeita do original norueguês, nela
a maior radicalização aparece numa proposital concisão do texto. Que, por outro
lado, ocasiona, com isto , um certo prejuízo no diagnóstico, de aprofundada
interiorização , da teatralidade de Ibsen.
Aqui, a concepção cenográfica( Franco Battista/Ariel Vaccaro)
não sugere nenhum vínculo, na aridez minimalista de uma sala de visitas, com uma
ambiência familiar em processo de desmoronamento. E o desenho de luz (Gonzalo Martinez)branca , vazado e sem nuances, também, pouco contribui.
Mas o irradiante contraste entre as atitudes ingênuas de uma
Nora (Miriam Freeland, em vigorosa atuação),
como brinquedo/objeto sob as rédeas do marido Torwald, e sua progressiva
insubmissão, tem um luminar retorno na espontaneidade
das variações temperamentais de Roberto Bomtempo.
Com maior sobriedade,
diante da força emotiva e sensorial dos personagens de Nora e Torwald, são
convincentes as presenças do elenco
complementar. Com simpatia e amadurecimento em Regina Sampaio e maior acomodação
na composição dos papéis de Anna Sant’Anna e Leandro Baumgratz.
E um empenho artesanal da dupla direção ( Roberto Bomtempo/Symone
Strobel) superando quaisquer obstáculos , com a valoração do texto e o fluente
e seguro tom estético exploratório da performance. Capaz , enfim, de
materializar o alcance dimensional desta reapresentação dramática de um ícone
do teatro universal.
CASA DE BONECAS está em cartaz no Teatro Cândido Mendes, Ipanema, de quinta a sábado, às 21h; domingo,às 19h. 70 minutos. Até 18 de dezembro..
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