INVASÃO TEATRAL BAIANA NOS PALCOS CARIOCAS

NUNCA NADE SOZINHO. Fotos/Valéria Simões e Renan Ribeiro.

Os palcos cariocas recebem o jovem teatro baiano através de duas montagens originais de Salvador e uma coprodução das duas capitais. 

Isto remete ao ano 2000 quando a grande surpresa da temporada era A Máquina, concepção e direção do pernambucano João Falcão e que deixou, como rica herança para a arte cênica carioca, os atores Wagner Moura, Lázaro Ramos e o mineiro/baiano Vladimir Brichta.

A primeira montagem é Nunca Nade Sozinho, do já bastante conhecido, por aqui, dramaturgo canadense Daniel Maclvor (com In On It, A Primeira Vista e Cine Monstro).

A peça mostra, em formato de 13 rounds, a desenfreada competição pelos meandros do poder, entre dois homens com inusitadas revelações de vida sob mediação de uma juíza (Nadja Turenkko) que, em dúplice oficio, ainda assume a liderança condutora do espetáculo.

Além do equilibrado e revelador presencial do elenco masculino (Ciro Sales e Kadu Veiga), numa egocêntrica partida de perdas e ganhos, expressa no entremeio de incisivo gestual corpóreo e de recortes confessionais sobre o processo de construção do espetáculo, via projeções visuais ao fundo do palco.

Sustentando-se ainda em ambientais efeitos luminares (João Sanches) e fazendo uso de uma uniforme indumentária (Solon Diego) apostando na combinação de tons mais discricionários.

O destaque fica com a envolvente concepção visual (Maurício Cardoso Júnior) em que praia e barcos conduzem a um clima de onirismo surrealista, complementada pela projeção do processo criativo deflagrando questões filosóficas e estéticas.

Às vezes, através de solos e dialetações, apoiando-se num certo experimentalismo linguístico não muito clarificado em sua pulsão crítica, direcionada sempre por abordagens sociais e psicológicas em compasso metafórico e abstrato.

ENTRE NÓS. Foto / Sora Maia.

Quanto ao texto de João Sanches - Entre Nós, tendo à frente o seu próprio autor, trata - se de uma montagem concebida originalmente para o meio escolar e que alcançou, com seu sucesso, o circuito profissional. Onde ele acumula, além da escritura textual, a iluminação e o figurino, inseridos numa cenografia minimalista (Daniela Steele).

Partindo de uma proposta de teatro didático  sobre a diversidade e os embates da comunidade LGBT, a partir do questionamento da homofobia no ensino público baiano.

Onde a narrativa dramática se estrutura nos diálogos de dois jovens adolescentes, com precisas tiradas de bem humorada ironia e referencias inteligentes sobre os relacionamentos do mesmo sexo.

Apesar de muito jovens, os atores (Igor Epifânio e Anderson de Souza) mostram convicta interatividade com a plateia, em seus improvisos narrativos e verbais, com música ao vivo (Leonardo Bittencourt), contando ainda com a acertada condução do diretor/dublê de autor (João Sanches).

Já o caso de Os Javalis, inspirado no universo do teatro do absurdo, com um conceitual estético de recorrência a Beckett e Ionesco, é uma original transmutação textual e cênica do universo polêmico destes criadores por um dos mais conceituados autores baianos da nova geração - Gil Vicente Tavares - que vem se tornando um especialista no gênero.

Em forma de parábola, o roteiro dramatúrgico aborda o pânico, num confronto quase alucinógeno, de uma cidade atacada por javalis, descortinado como fuga ao vazio existencial de dois personagens (Rafael Medrado e Emiliano D'Avila).

Com a simplicidade funcional dos elementos tecno-artísticos desde os sucintos elementos cênicos (Lorena Lima) a um figurino cotidiano (Hugo Leão), sob uma iluminação (Fábio Espírito Santo e João Gioia) mais vazada que focal, ressaltada por energizada trilha sonora (Ricco Viana).

A boa performance dos atores tem o seguro comando de Emiliano D'Ávila, paralelo à atuação atoral, agora, em sua primeira incursão no papel de guia diretor, depois de sua revelação como mais um talentoso intérprete baiano radicado na cena teatral e televisiva carioca .

                                           Wagner Corrêa de Araújo

OS JAVALIS. Foto / Bruno Heitor.

Estas três peças estiveram na cena carioca durante a  temporada 2014, entre maio e julho.

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