INSIGNIFICÂNCIA : O INUSITADO ENCONTRO DE QUATRO PERSONAGENS MIDIÁTICAS NUMA IMAGINÁRIA NOITE NOVAIORQUINA

 

Insignificância, Uma Comédia Relativa de Terry Johnson. Victor Garcia Peralta/Direção Concepcional. Março/2025. João Caldas/Fotos.


O dramaturgo inglês Terry Johnson já é bastante conhecido nos palcos brasileiros através da peça Histeria, sucesso na direção de Jô Soares, em 2017. E que, subliminarmente, por seu enredo remetia também a encontros fictícios de personalidades icônicas, tema daquela que fora a peça inaugural do autor, em 1983, titulada Insignificância.

Onde quatro personalidades midiáticas nos anos cinquenta, sob o controvertido governo de Ike (Eisenhower), por um destes acasos sociais acabam reunidas na suíte de um hotel de Manhattan, em que está hospedado o cientista Albert Einstein. Sendo os outros três, nada mais nada menos, do que o Senador Joseph McCarthy, o jogador de beisebol Joe DiMaggio e a atriz Marilyn Monroe.

Mas na peça, por seus caracteres comportamentais e de corporeidade, sendo apenas sugestionados como personagens sem os seus nomes originais. Até mesmo porque nunca teriam participado deste inusitado, irônico, mais que improvável desafio, face a face e  psicofísico, no cotidiano noturno nova-iorquino.

Em que cada um deles representaria o contraponto de diversificado universo de vivências existenciais, entre os sonhos e a realidade, os desejos, as conquistas e as frustrações. Tudo se aplicando, simultaneamente, a um excêntrico e visionário cientista, ao político  extremado conservador ideológico, à atriz insegura desejando não ser apenas um símbolo sexual, além do revolto jogador de beisebol ensimesmado pelo desalento de suas perspectivas amorosas. 


Insignificância. Victor Garcia Peralta/Direção Concepcional. Com Cássio Scapin, Marcos Veras, Norival Rizzo e Amanda Costa. Março/2025. João Caldas/Fotos.


A peça de Terry Johnson, estreada em 1983, teve dois anos depois uma versão fílmica por Nicolas Roeg, praticamente mantendo as premissas básicas da dramaturgia original, embora recorrendo a inúmeros flashbacks no entorno daquelas vidas e o que representariam aqueles embates em tempos avançados.

Ficando, quanto aos palcos, maior o enfrentamento da conexão acertada de um sutil sotaque de comédia com a intenção reflexiva da narrativa para o alcance do espectador, especialmente o descompromissado com aquelas referências científicas e políticas, possibilitadas na trajetória confessional destas personalidades emblematizadas no mundo das celebridades e contextualizadas no american way of life.

E é no entremeio destas abordagens que se define a amargura de Einstein por ter, com sua teoria da relatividade, facilitado a concepção da bomba atômica, paralelo ao ideário do macarthismo propulsor da guerra fria, no confronto do expansionismo soviético e a obsessão pelo domínio global norte americano.  

Enquanto, no caso de Marilyn Monroe, na denúncia da exploração da condição feminina como mero objeto do prazer para uma masculinidade tóxica, na postulação recessiva de seu então parceiro amoroso, um profissional esportivo, simplório viciado em chicletes, compulsivo marido que preferia tê-la como uma mulher domesticada pelo lar.

Temas tratados com uma certa superficialidade na narrativa autoral dramatúrgica e, de forma perceptível, sendo abstraídos pelos qualitativos acertos cênicos e performáticos, assumidos em espetáculo transmutado pelo convicto empenho da artesania direcional de Victor Garcia Peralta, correspondido por um elenco perfeccionista em suas caracterizações gestuais e vocais.

Ficando difícil não destacar qualquer um deles, seja o amargurado Cientista (Cássio Scapin) frente ao intimidador reacionarismo do Senador (Norival Rizzo). Ou a Atriz (Amanda Costa), sensualizada em sua imagem, querendo se superar pelo talento artístico, ao lado do ciumento Jogador (Marcos Veras) dando vazão à repulsa dele pela lascívia de sua mulher que a faz ser desejada por todos.

Convergindo para a finalização estética, a plasticidade fascinante de uma caixa cênica preenchida por atraente concepção cenográfica (Chris Aizner) ampliada nas projeções frontais naturalistas de imagens de Nova York em movimento, numa super dimensionada tela led. E efeitos luminares (Beto Bruel) ressaltando os elementos identitários dos personagens em elegantes figurinos (Fábio Namatame), sob as intervenções sonoro-musicais de Marcelo Pellegrini.

E o oportuno complemento na denominação da peça como Insignificância, Uma Comédia Relativa, dando “significância” crítica à simpática versão textual (Gregório Duvivier), na intencionalidade de que a proposta é fazer rir, mas sem nunca deixar de lado, ainda que instantânea, a pulsão reflexiva...   

                           

                                           Wagner Corrêa de Araújo

 

Insignificância está em cartaz no Teatro Adolpho Bloch / Glória, sextas e sábados, às 20h; domingos às 18h, até 6 de abril.

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