O Quebra-Nozes/ BTM. Helio Bejani/Jorge Teixeira/ Direção Concepcional/Coreográfica. Dezembro/2024. Daniel Ebendinger/Fotos. |
Ninguém jamais poderia imaginar que aquela instável estreia
de O Quebra-Nozes
em São Petersburgo, dezembro de 1892, acabaria transformando o terceiro dos
balés de Tchaikovsky, num dos espetáculos
favoritos das famílias, especialmente das crianças, com sua conexão temática do
encantamento e da magia de uma noite de Natal.
Embora o seu enredo, inspirado num conto gótico de E. T. A. Hoffman, de 1816, sugestionasse inicialmente um clima soturno
através das malévolas artimanhas do Rei dos Camundongos, foi a adaptação definitiva por
Alexandre Dumas, pai, que transmutou tudo
isso numa fábula entremeada por um delirante clima de aventura, mistério e
fantasia.
A fascinação exercida por este balé há mais de um século é
irrestrita e, além da versão ligada rigorosamente à sua original concepção
coreográfica por Marius Petipa, com
inúmeras releituras modernas menos presas à tradição. Como foi o caso da
introdução de brinquedos eletrônicos na coreografia de Mark Morris ou de sua partitura sendo executada jazzisticamente, numa subvertida titulação de “Quebra Nozes
do Harlem”.
Basicamente, o enredo do emblemático balé mostra uma festa de
Natal onde a menina Clara ganha como
presente de seu tio Drosselmeyer, um
boneco quebra-nozes e, ao adormecer, tem um sonho que a conduz magicamente aos
reinos da neve e dos doces, depois dos sustos ao se deparar com uma batalha
entre soldadinhos de brinquedo e de raivosas ratazanas.
O Quebra-Nozes/BTM. Helio Bejani e Jorge Teixeira/Direção Concepcional Coreográfica. Javier Logioia Orbe/Regência OSTM. Dezembro/2024. Daniel Ebendinger/Fotos. |
Narrativa que acabou transformando O Quebra-Nozes no espetáculo
coreográfico mais concorrido, com suas habituais temporadas no mês em que se
comemora o evento religioso/social. Por sua atração exercida sobre muitas
crianças sendo, quase sempre, o primeiro contato que estas tem com uma
performance completa de balé clássico e de uma orquestra sinfônica.
Ausente do palco do Theatro Municipal desde 2016, O
Quebra-Nozes volta sob um dúplice comando concepcional e coreográfico (Helio Bejani e Jorge Teixeira), partindo do original de Marius Petipa. Em montagem com uma maior inclusão dos alunos
iniciantes e adiantados da Escola Estadual de Dança Maria Olenewa, ao lado dos integrantes
oficiais do BTM, além de nova cenografia (Manoel Puocci/C. Galdino) e de vistosos
figurinos (Tania Agra).
Onde o maestro argentino Javier
Logioia Orbe, na firme regencia da OSTM, mostrou sua reconhecida intimidade
de longa data com a música de Tchaikovsky para balé. Embora sem conseguir
superar os reverberativos acordes das trompas, em algumas das passagens da
partitura, num deslize que tem sido ocasional entre os instrumentistas
deste naipe.
Havendo a introdução, durante o prólogo orquestral, de uma
não habitual representação cenográfica de um orfanato, quebrando em parte a
expectativa de surpresa diante do belo cenário natalino. Incluindo-se, ainda,
uma possível restrição ao painel frontal do Ato II, pelo sotaque quase apelativo
em sua figuração de bolos e tortas, para conceitualizar pictoricamente o Reino dos Doces.
A atuação performática do Corpo de Baile e dos solistas demonstrando um coesivo desempenho tanto nas cenas de conjunto, como nos solos e formações grupais das danças características. Também não deixando de ressaltar, aqui, no staff masculino as seguras participações de Rodrigo Hermesmeyer como partner nas cenas finais, no papel do Príncipe, e de Edifranc Alves, num prevalente uso da pantomima para um ator/bailarino na sustentação do personagem Dresselmeyer.
Com alguns destaques mais que especiais no cast feminino da estreia, desde uma expressiva Manuela Roçado como a Rainha do Reino das Neves. Ou de Márcia Jaqueline, com precisa técnica e emoção presencial numa convicta Fada Açucarada do Reino dos Doces, no celebrado Pas-de-Deux do Ato II, com um alcance exponencial nas suas extensivas e exigentes variações.
Através de uma superprodução provocadora de inusitado surto de
buscas com instantâneo esgotamento de ingressos, o que levou à correta decisão do
Theatro Municipal para transmitir as três últimas récitas num telão externo. Num
quase processo identitário com midiáticos grupos de rock e de MPB, sob
perceptível fenômeno ascendente de ampliação do interesse do público carioca pelo
balé clássico...
Wagner Corrêa de Araújo
Um comentário:
Adoro o Quebra Nozes. Texto lindo. Beijos Cris.
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