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Sidney Magal, Muito Mais Que Um Amante Latino. Débora Dubois /Direção. Novembro/2022. Fotos/João Caldas.
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Na passagem dos seus cinquenta anos de inicio da carreira, o cantor
Sidney Magal ganhou dois musicais com dúplice inspiração na biografia escrita
por Bruna Ramos da Fonte – no primeiro semestre de 2022 a versão carioca
titulada “Quero Vê-la Sorrir” e a partir de outubro, a produção paulista Sidney Magal - Muito Mais Que Um Amante Latino.
Tornando-se perceptível, em termos comparativos, uma maior
ousadia e um melhor acerto na segunda montagem, esta ainda em cartaz nos palcos
paulistas, sob a direção concepcional de
Débora Dubois.
Marcada por sua temporada, em tempos de acirrado retrocesso
cultural e comportamental em relação aos conflitos entre uma postura machista e
os signos gays, paradoxalmente icônicos tanto na carreira do cantor de origem
carioca como por sua enfatização no dimensionamento estético dos dois musicais
biográficos.
De um lado, o melodramático e possessivo amante latino
caracterizado nas letras de seu repertório, enquanto sua performance, em abusadas
roupas aquareladas e sem qualquer
censura gestual, quebrava todos os preconceitos relativos à comunidade LGBT.
Onde sua própria vida artística, entre altos e baixos,
sucessos e fracassos, no entremeio de atuações em churrascarias, circo e
televisão, depois de quase quatro décadas, acaba sendo trocada pela tranquilidade
interiorana, através do casamento e filhos que lhe deu a baiana Magali, levando-o
a se radicar, definitivamente, naquelas plagas.
O roteiro dramatúrgico é da própria autora de sua alentada biografia
de 400 páginas, da qual Bruna Ramos traça um itinerário familiar que começa
pelo sonho frustrado da mãe Sônia (prima de Vinicius de Moraes) em
se tornar cantora de sucesso. E que ela projeta, especularmente, no entorno da ascensão
artística do filho Sidney Magal, do seu despontar até os seus últimos arroubos artísticos quando uma de suas canções torna-se
tema da abertura de novela global.
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Luis Vasconcelos em Sidney Magal, Muito Mais Que Um Amante Latino. Bruna Ramos da Fonte/Dramaturgia.Novembro/2022. Fotos/João Caldas.
Com um envolvente
comando cênico de Debora Dubois, energizado pela direção musical de Caíque Vandera, o espetáculo tem seus
melhores momentos no presencial revelador dos atributos de um ator estreante de
19 anos - Luis Vasconcelos. Cantando e dançando mimeticamente convincente, no
visual e no gestual, de que ali estaria de volta o próprio Magal.
Dividindo o palco com o protagonismo também titular de Juan
Alba que, aqui, assume os anos de maturidade e afastamento dos refletores de um
dos mais idolatrados nomes do cancioneiro brega/romântico brasileiro, mentor de
certos hits simbólicos (caso de Meu
Sangue Ferve Por Você ou Amante Latino). Mesmo assim, com o seu reconhecido
talento interpretativo de décadas, ele não consegue superar o potencial
alcance interativo da jovialidade física e musical de Luís Vasconcelos com a
plateia.
O que se torna mais flagrante no apelo mais reiterativo da
narração sequencial do processo de decadência de Magal, desviando de certa
maneira o acompanhamento do espectador pelo clima mais frenético a partir do prólogo, fissurando o
andamento rítmico e o timing de sua representação. Apesar de acertar na seleção das canções, na coreografia
(Patricia Kfouri) mais contagiante sob um sotaque de deboche, no frenesi de texturas tonais e no assumido exagero da indumentária (Fábio Namatame), junto ao jogo lúdico e psicodélico de luzes (Wagner Freire), que
preenchem um quadro cenográfico kitsch
(sob dúplice ideário de Debora Dubois) sugestionando uma boite/cabaret das
antigas.
Além dos dois atores protagonistas/titulares, integrando um elenco de 12 atores/ bailarinos e quatro músicos, destacam-se as
representações da atriz chilena Yael
Pecarovich como a mãe dona Sônia, abrindo o roteiro musical com luminosa
atuação cênico/vocal. Valendo citar ainda a convicta atuação de Fernando
Vieira, alternando papeis de Vinicius de Moraes a apresentadores televisivos,
como Chacrinha. Se há meio século o cancioneiro de Sidney Magal assustava os
puristas musicais, a classe A da MPB como uma síndrome da cafonice com suas letras postulando que “o amor tem de ser
piegas, tem de ser brega”, assistir, hoje, um musical praticamente inspirado neste
ideário faz do pejorativo um manifesto chique de exaltação ao kitsch. Para o
que der e vier do preconceito à aceitação, que importa o metafórico conceitual estético
quando, emblematicamente, o recado a ser dado é outro. Afinal, para este Muito mais Que Um Amante
Latino, não é atoa que “somos um país, graças a Deus, muito brega"... |
Wagner Corrêa de Araújo
Sidney Magal, Muito Mais Que Um Amante Latino está em cartaz
no Teatro Porto /SP, sexta e sábado, às 20h; domingo, às 17hs, até 11 de dezembro.
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