B-MARCHE – BALÉ DO TMRJ : EM TEMPOS NEBULOSOS, A BUSCA DA REDENÇÃO

FOTOS/TENDO SANTOS

O Balé do Teatro Municipal continua a sua luta redentora pela reocupação do lugar que lhe cabe, por tradição e merecimento, como única companhia oficial brasileira de substrato clássico. Prevalente na necessária reabertura de vagas, suprindo as carências da partida de muitos bailarinos, e na retomada da nobre missão em torno de um repertório histórico.

Desta vez, a partir da proposta comemorativa do sesquicentenário de morte de Hector Berlioz, com um espetáculo titulado como B-Marche-Noites de Berlioz, através de algumas obras do compositor francês – o ciclo de canções “Les Nuits d’Été”, a abertura Carnaval Romano, a Marcha da ópera “Les Troyens”, além de dois movimentos da Sinfonia Fantástica.

Para a realização de tal tributo, contando com a participação da OSTM, sob regência de Carlos Prazeres, e concepção direcional-coreográfica do bailarino Thiago Soares. Trazendo, ainda, na criação tecno-artística, Oskar Metsavaht (direção de arte), além do valioso suporte cênico do coreógrafo Renato Cruz.

Pela integralização deste ideário estético, coreográfico e musical, coletivamente irmanados num mesmo esforço inventor, para dar dignidade ao programa que abre a  temporada 2019 do Ballet do Municipal, no ano em que o teatro completa seus 110 anos.

Na abertura, a escolha de uma obra menos acessível de Berlioz – Les Nuits d’Été – originalmente um ciclo vocal com seis poemas de Théophile Gautier para soprano e piano, de 1869. E, posteriormente, orquestrado numa escrita instrumental com nuances mais camerísticas, priorizando cordas e sopros para transcrever o intimismo temático em torno da ausência, da perda e da morte de um ser amado.

Alcançando, agora, sua primeira e completa versão coreográfica, mas tornada de limitado resultado estético. Com seu quase no sense das interferências gestuais / miméticas, via solos e duos dos bailarinos, nos introspectivos timbres melódicos da partitura e no discricionário presencial físico dos cantores : Cíntia Fortunato e Laura Cavalcanti (sopranos) e Geílson Santo (tenor).

Superando-se, felizmente, na segunda parte, com a envolvência de antológica seleção de obras mais populares de Berlioz, em artesanal comando orquestral (Carlos Prazeres). E no energizado desempenho dos solistas e do Corpo de Baile, resgatando os deslizes coreográficos do ato primeiro.

Onde o uso de figurinos (Yan Seabra) de tons sóbrios, do ocre ao branco, tem adequada inserção num palco nu deixando à mostra seus bastidores. Sob alterativos efeitos luminares, ora vazados ora focais, de Maneco Quinderé. Num bravo propósito de homenagear todos os integrantes deste Corpo Estável do TM, ao sugestionar a ambiência de exercício cotidiano do oficio de bailarinos.

Enquanto, sequencialmente, a performance vai reunindo, em solos, duos e formações grupais, os principais solistas em competentes atuações. Com destaque especial  para uma dupla estelar – Cicero Gomes e Cláudia Mota – e no brilho com que se apresentam, entre outros, bailarinos tarimbados como Renata Tubarão e Alef Albert.

Seguindo-se as apresentações de celebrizados nomes de outras gerações como Francisco Timbó, Aurea Hammerli, Cecília Kerche, Ana Botafogo, numa espécie de desfile historicista de vivências artísticas a provar que, apesar de todas as crises, há que resistir sempre.

O conceitual coreográfico assumido, aqui, por Thiago Soares, em área na qual pretende investir mais, de agora em diante, dando novos rumos à sua vitoriosa trajetória, logo após a mudança de seu status no Royal Ballet para emérito artista convidado, privilegiou os fundamentos neo-clássicos para melhor aproveitamento deste potencial implícito ao Balé do TM.

Num luminoso referencial do costumeiro Défilé du Ballet de l’Opera de Paris, através da Marcha dos Troianos, com autoridade cênica e convicção coreográfica, em provocação criativa para que, o Balé do Municipal, entre tantas adversidades, enfim,  mantenha intactas sua pulsão artística e sua carismática empatia com o público.


                                           Wagner Corrêa de Araújo



B-MARCHE-BALÉ DO THEATRO MUNICIPAL está em cartaz, quinta e sexta, às 20h; sábado e domingo, às 17h. 100 minutos. Até 28 de abril.

Um comentário:

Ida Vicenzia disse...

Em boa hora a lembrança dos bailarinos e das apresentações do Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Otima critica. Saudades do balé!

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