GATA EM TELHADO DE ZINCO QUENTE: ALMAS TORTURADAS

FOTOS/JOÃO WAINER

Solitários, reprimidos, marginalizados, mórbidos, viciados, corruptos,violentos, decadentes, derrotados, resignados, assim são os personagens que habitam o imaginário dramatúrgico de Tennessee Williams.

Almas torturadas sim, mas capazes ainda de encontrar poesia na tragédia , como diz um deles parodiando Oscar Wilde: “Nós estamos na sarjeta mas alguns de nós olham as estrelas”.

E é esta contradição entre o lirismo e o caos que se tornou signo de uma obra de luminosidade incisiva , capaz de provocar o desnudamento  dos pesadelos e revelar os transes de seres em permanente linha abismal.

Em Gata em Telhado de Zinco Quente, estreada nos palcos  em 1955, com  a direção de Elia Kazan, é tal a densidade e aridez de sua trama, que este sugeriu a suavização da cena final ainda que Tennessee Williams discordasse.

Ambientada na solarização do Sul rural, aqui no dia dos 65 anos do patriarca Paizão (Zécarlos Machado), seus dois filhos Brick(Augusto Zacchi) e Gooper(André Garolli), com suas respectivas mulheres Maggie( Bárbara Paz) e Mae(Fernanda Viacava), incluída a Mãezona( Noemi Marinho) , aguardam a festa comemorativa.

Mas antes das amenidades, há o descortino do descompasso familiar, capaz de gerar um perigoso clima de situações/limite. E que, num inesperado  crescendo, gera um insólito embate de personalismos e identidades, entre preconceituosas posturas e agressivos ataques verbais.

Priorizando o afloramento de desejos reprimidos, da insatisfação sexual de Maggie diante da frieza do marido alcoólatra Brick, como de sua presumida "pureza de amizade", disfarce contumaz da homoafetivadade pelo amigo suicida Skypper.

Junto ao  rigoroso sustento da conceituação  textual da obra, o comando diretor de Eduardo Tolentino, evitando virtuosismos supérfluos, tem pleno domínio da sua irradiante exploração estética/emotiva do universo de T. Williams.

No desenvolver de sua gramática cênica  (Ana Maria Abreu/Alexandre Toro)num espaço único(o quarto do casal Brick/Maggie), atravessado pelo requinte dos figurinos(Gloria Kalil), pelas nuances da luz(Nelson Ferreira)e das incidências sonoro/musicais(Surdina),é impulsionada uma ambientação psicológica sedutora.

Onde o inventário dramático é completado na unidade interpretativa do elenco . Capaz não só de bem delinear as sutis verbalizações do ensimesmado papel de  Augusto Zacchi como da carismática força sensorial /emotiva de Barbara Paz. E tendo, ainda, a enérgica performance de Zécarlos Machado, em especial na passagem dialogal,de compasso inquisidor ,com Zacchi.

Sem esquecer a cativante  espontaneidade de Noemi Marinho e a correta inflexão de personificações  mais coadjuvantes( Fernanda Viacava/André Garolli).

Gata em Telhado de Zinco Quente tem, assim, no alto voo de sua teatralização pelo Grupo Tapa, competência artesanal de sobra para alcançar  a cúmplice adesão das plateias.


GATA EM TELHADO DE ZINCO QUENTE está em cartaz no Teatro I do CCBB , Centro, de quarta a domingo, às 19h. 120 minutos. Até 21 de agosto.

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