FOTOS/FABIANA STIG |
Em tempos sombrios para a produção operística em palcos brasileiros,
esta TURANDOT do Municipal paulista não
deixa de ser eficaz como uma montagem de bons propósitos, entre ocasionais deslizes
e dignos acertos.
Com sua intencionalidade de resgatar os princípios básicos que
configuram o conceitual da Grande Opera, seu diretor e idealizador cênico André
Heller-Lopes desta vez ousou sem avançar muito na sua releitura concepcional da derradeira
ópera de Puccini, deixada incompleta no ano de sua morte (1924).
Optando pelo mais usual dos seus finais, o que o compositor
Alfano lhe imprimiu (embora exista um outro mais contemporâneo de Luciano Berio),
respeitando sua progressão dramática original, mas alterando a cena final do suicídio
da personagem Liu o que não chega a provocar um absoluto incomodo.
Estruturando-a em três planos de tempo/espaço para visualizar
uma China milenar, entre o fabular e o histórico, mas com o olhar armado na
contemporaneidade. O que plasticamente é expresso na indumentária anos 60 do
coro contrastando com a tradição de figurinos
referenciais da Ópera de Pequim.
Teatro dentro do teatro, a trama ocorre no limitado espaço arena,
entre galerias superpostas ocupadas pelos integrantes coristas, em formato
circular com uma nuance dos palcos de representação elisabetanos no bonito e
funcional desenho cênico de Renato Theobaldo.
O que não ocorre em
total sincronicidade com os figurinos (Sofia Di Nunzio) misturando o
aristocrático com o circense numa profusão de cores quase de efeito kitsch, suavizado apenas nos trajes mais
discricionários do coro.
Os efeitos luminares (Fabio Retti) são quase sempre vazados
na prevalência de inúmeros personagens simultaneamente em cena, com poucas
chances para luzes mais focais. O que se dá, ao mesmo tempo, uma ambiência technicolor envolvente se perde em no sense de um globo lunar esparramando luzes como numa pista de disco music.
A Orquestra Sinfônica
Municipal sob o comando de Roberto Minczuk, teve um desempenho elogiável na
exposição de uma partitura de Puccini mais sintonizada com novas harmonizações.
De perceptível alcance em potencializadas intervenções nas cenas corais
reunindo o Coro Lírico Municipal e o
Coral Paulistano.
No confronto com a representação dos papéis protagonistas,
mais uma vez alguns solistas brasileiros mostraram folego maior e convicção apurada na competição do habitual ringue
das vozes estrangeiras convidadas.
Como a irradiante performance da soprano Gabriella Pace (Liú) e seu consistente timbre capaz, sempre, de preencher
as exigências de seu papel. Sem deixar de destacar a força dos graves na
tessitura do baixo Luiz Ottavio Faria (Timur)
convincente ainda que em episódicas entradas.
No favorecido naipe dos personagens condutores da trama,
tanto a soprano norte americana Elizabeth Blancke-Biggs, no papel titular como Turandot, e o tenor canadense David
Pomeroy (Calaf) tinham por seu
presencial físico, chamativo e quase grandiloquente, tudo para se tornarem os donos da
performance.
Mas se havia a chance cênica de privilegiados papeis
faltou-lhes total integralização de bravos vencedores para se imporem como as
vozes definitivas da noite.
Se a soprano impressionou por sua técnica e seu talento na culminância da ária In Questa Reggia, o tenor acertou no mais ansiado momento lírico – Nessun dorma. No entanto, malgré
tout, seus vôos não foram altos o bastante para, em definitivo, arrastar e
dominar os amantes da ópera.
TURANDOT encerra a temporada lírica do Teatro Municipal/SP,
com dez récitas, entre 16 e 25 de novembro.
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