Ecos comemorativos dos
250 anos natalícios de Beethoven ainda se fazem presentes na temporada virtual de dança da Digital Dellarte
através da Sinfonia Pastoral, na versão do coreógrafo francês Thierry Malandain, criada especialmente
para a sua Cia – o Malandain Ballet
Biarritz ainda em 2019.
Um tributo ao compositor sequenciado, em 2020, por uma
arrojada releitura em torno de sua única obra exclusivamente concebida para os
palcos da dança – As Criaturas de
Prometeu, de 1801. Mas que foi ofuscada, a partir do século XX, pelas inúmeras
versões coreográficas da Sexta, Sétima e Nona Sinfonia.
Esta incursão embora titulada como La Pastorale toma a liberdade de incluir no seu score musical fragmentos de duas outras obras de Beethoven –
a abertura As Ruínas de Atenas + a Cantata opus 112 – Mar Calmo e Viagem Próspera.
Através de um vocabulário neoclássico não assumidamente rigoroso, Malandain dimensiona sua concepção numa formatação estética entre a pureza plástica
do “ballet blanc” e a energizada
sensualidade da dança contemporânea.
Sem se deter na sequencialidade narrativa da obra original, enunciada na epígrafe da partitura como “Sinfonia Pastoral ou Lembrança da Vida no Campo, mais emoção expressa do que uma pintura descritiva”, Thierry evoca em linguagem abstrata a ancestral ambiência rústica de pastores da Arcádia helênica.
Malandain Ballet Biarritz. La Pastorale. Coreografia -Thierry Malandain. 2019.Foto/Olivier Houeix. |
Ora através de brancas túnicas gregas e de citações de um
gestual no entremeio dos afrescos e vasos de uma Atenas mítica, com claro
referencial da Tarde do Fauno, de Nijinsky, ao Daphnis e Chloe, de Alexander
Benois.
Ora por intermédio da mimetização de seres marítimos, aéreos ou
florestais, a figuras mitológicas como ninfas, deuses e heróis do Olimpo.
Inicializada pelos movimentos esguios, ondulantes e atléticos dos bailarinos em
sugestiva paisagem cênica (Jorge Gallardo) estruturada em tablado de barras de
metal.
Onde os efeitos luminares (François Menou) e os figurinos (J.
Gallardo) acentuam o contraste entre a recorrência à calma do gestual acadêmico e a uma vertiginosa exploração
da corporeidade dos 22 bailarinos.
Priorizando cenas grupais e duos, com um destaque absoluto para os emotivos solos do jovem e apolíneo bailarino Hugo Layer, com certo sotaque de androgenia protagonizando metaforicamente uma espécie de anti-herói romântico. Beethoviano na expressão da alegria pastoral e da dor do destino, entre o delírio da natureza e a trágica realidade da finitude humana.
Wagner Corrêa de Araújo
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