FOTOS/MANUELA ABDALA |
“Algum dia eu ainda
irei compor uma música que explique o que é fazer amor com 25.000 pessoas
durante um show e depois voltar para casa sózinha".
E foi o psicodelismo , entre cores sanguíneas , sonoridades
gritantes e incensos viajantes, apenas o apanágio a ocultar as dolorosas
contradições afetivo/comportamentais que marcaram a trajetória existencial de Janis Joplin.
Desde os conservadorismos familiares e o preconceituoso olhar
da provinciana comunidade texana de Port Arthur,contra os quais o espirito juvenil da
adolescente ousou desafiar com sua rebeldia hippie. Assumida, mais incisivamente, na sua partida para a San Francisco, paraíso citadino de paz e amor, sexo, drogas e rock’n’roll
, onde se midiatizou como uma potencializada blues/rock star.
Sua breve incursão artístico/vivencial, interrompida por
uma over dose aos 27 anos, tem sido tema recorrente nas telas e nos palcos,
desde o registro documentário de Howard
Alk (1974) ao recente de Amy Berg(2016),
passando pelo disfarce biográfico no filme The
Rose,1979,de Mark Rydell.
E tem, agora, com Janis, uma diferencial versão no formato de pocket teatro musical , com roteiro dramatúrgico
de Diogo Liberano, direção de Sergio Módena e performance solo da atriz/cantora
Carol Fazu.
Numa bem urdida narrativa
autoral(Diogo Liberano), fragmentária e
fugindo do cronológico, através de recortes memorialísticos de Joplin, dos seus escritos
confessionais e epistolares a entrevistas
e citações opinativas / ficcionais.
Retomados numa linguagem atemporal, num fluxo tete a tete, redivivo da personagem(Janis Joplin) e da protagonista titular (Carol Fazu) com o público, entremeada com alguns de seus maiores
hits. Ressaltando, na envolvente concepção diretorial de Sérgio Módena, uma
gramática cênica de nítidos contrastes reflexivos entre adrenalina e
vulnerabilidade, crueza e sensitividade, verismo e delírio, poesia e tragédia.
Aqui a possibilidade de veraz identificação física com a personalidade original
é o que menos importa diante do impacto contagiante/ritualístico da
representação, no compasso de um clímax flashback da contracultura anos 60/70 e na cumplicidade singular de espectadores de mediana idade em diante.
Num tributo teatral woman
show, com direito inclusive a uma individualística tessitura vocal em
rascante rouquidão aproximativa de
Joplin. Sintonizada por simbólicos figurinos, remissivos aos anos dourados e ao aroma de patchouli,
e a cenografia psicodelizada (em
dúplice criação de Marcelo Marques) e energizada pelas modulações
luminares de Fernanda e Tiago Mantovani.
E que se faz mais completo ainda com a excelência
espiralizada das passagens cênico/solistas do guitarrista Arthur Martau, ao lado de uma banda de craques (Antônio Van Hahn, Eduardo
Rorato, Gilson Freitas, Marcelo Muller) sob arranjos regenciais de Ricco Viana.
Onde prevalecem, enfim, a visceralidade vocal/presencial de Carol Fazu
no pulsionamento de um
hedonismo, estético e sensorial, palco/plateia e a grande e grata surpresa de sua
revelação.
Como se metaforizasse,
ora um anjo enunciador de primal
alegria extasíaca , ora um patético demônio encharcado em álcool e drogas, direcionando o
prazer orgiástico e o sofrimento laminar de um ícone musical dramatizado.
Wagner Corrêa de Araújo
JANIS está em cartaz no Oi Futuro Flamengo, de quinta a domingo, às 20h. 80 minutos. Até 16 de julho.
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