FOTOS/ELISA MENDES |
A jornada fotográfica do nu masculino inicializou-se a partir
de 1850, com o pioneirismo corajoso de Eugène Durieu na transmutação idealizada
, em viva carnalidade, de míticos “orfeus”,”narcisos” e “dionísios”. E, no século
XX, retomada nos efebos “greco/romanos” de Wilhelm von Gloeden, passando pelos
corpos fascistas de Arno Brecker, até a crua virilidade em Mapplethorpe ou na corporeidade homoerótica
com Pierre et Gilles.
Tornando-se o mais celebrado brasileiro nesta pegada, o
teórico, critico de arte e fotógrafo Alair Gomes. Que, num quase referencial irônico do confronto estético de
Umberto Eco entre a beleza e a feiura ,
com o olhar armado de sua câmera, inventariou a fisicalidade ,de atlético sensorialismo, dos garotões da praia de Ipanema.
Da sua janela frontal, em panorâmica beira mar ipanemense, furtivamente
clicava flashes instantâneos, transmutados em ensaios pictóricos e publicações, angariando fama em prestigiosas
instituições culturais além fronteiras.
E na não resistência, enfim expondo seu instinto autoral, no irresistível
apelo deste Olimpo carioca,
arrastando a domicílio seus protótipos,
surfistas e malhadores. Muito além das pulsões deste imaginário artístico, para
sessões intimistas , carregadas de promessas profissionais, trocando arte , sexo e dinheiro.
E é nesse clima com sutis nuances gideanas, genetianas e fassbinderianas,
mesmo entre naturais e inescapáveis estereótipos do universo homoerótico, que Alair perfaz sua diferencial incursão dramatúrgica .
Com sua apurada textualidade (Gustavo Pinheiro) e no duelo da tríptica performance, entre os maneirismos da maturidade (Edwin Luisi) e a revelação ascensional (André
Rosa/Raphael Sander), sob o seguro comando mor de Cesar Augusto.
Que, numa manipulação visceral , confronta o teor apolíneo/dionisíaco, ora na exposição plástica
do perfeccionismo físico dos jovens atores, ora nos aportes orgiásticos de suas
relações afetivas , entre o interesse fugaz e o risco assassino.
Estabelecendo pontes atemporais do lastro escultórico greco, romano,
renascentista e barroco com a corporeidade contemporânea, através da rica
narrativa memorialística de Alair Gomes.
E, num veemente mergulho de Edwin Luisi, no protagonismo titular , em tom confessional de cativante
dimensionamento psicológico e convicto contraponto crítico.
Embora facilitados pela identificação visual como atores>personagens
no papel de meros objetos do desejo,André Rosa e Raphael Sander, alcançam através das marcações diretoriais, um convincente empenho, de raras intimidações, no equilíbrio entre a intencionalidade da palavra teatral e o presencial físico.
Alair se integraliza, ainda na minimalista
arquitetura cênica (Marina Villas Boas) , na essencialidade do figurino (Ticiana
Passos) e do desenho de luz (Tomás
Ribas), de sugestivo resultado, entre projeções, videografismos e sombras.
Além da trilha sonora incidental de Rodrigo
Marçal realçando a direção de movimento
de Luísa Pitta.
Poético e contundente,
sóbrio e tenso, verista e questionador, irreverente e introspectivo, eis aí mais um espetáculo desentorpecedor, abrindo portas contra o preconceito à livre
manifestação das diversidades sexuais.
Wagner Corrêa de Araújo
ALAIR está em cartaz no Teatro Laura Alvim, Ipanema, de quarta a sábado, às 21h;domingo, às 20h. 70 minutos. Até 2 de julho.
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