AmazôniA/Grupo de Dança DC. João Wlamir/Direção Concepcional. Junho/2024. Fotos/Wagner Brum. |
No final dos anos 80 um grupo de bailarinos solistas do
Theatro Municipal teve a idéia de criar uma Cia de dança voltada para uma linguagem
contemporânea conectada à sólida base clássica de seus integrantes. Com o
diferencial de sua proposta começando já na própria denominação Grupo de Dança DC – Dissídio
Coletivo, com um subliminar significado estético-social.
A partir de 1987, desde a sua estruturação tendo como mentor concepcional/coreográfico
o conceituado bailarino João Wlamir, o Grupo DC desenvolveu uma vitoriosa
trajetória em inúmeras turnês brasileiras que se estenderam a apresentações em
palcos e festivais internacionais.
Sempre com o aplauso da crítica e o sucesso de público, mais
a participação, como convidados em alguns espetáculos, de nomes solistas fundamentais
da dança clássica em moldes nacionais, entre outros, Ana Botafogo, Nora
Esteves, Cecília Kerche, Auréa Hammerli, Francisco Timbó, Paulo Rodrigues.
Desenvolvendo um repertório original que incluía incursões de
sotaque neoclássico, releituras de obras contemporâneas e a priorização de
temáticas plenas de brasilidade, em criações de grande força como A.M.O.R, Rio 24 Horas, 16 Minutos Depois, esta última inspirada no Bolero de Ravel, para terminar
esta sua luminosa viagem pelos caminhos coreográficos nacionalistas com Cores do Brasil, em 2014.
AmazôniA/Grupo de Dança DC. João Wlamir/Direção Concepcional. Junho/2024. Fotos/Wagner Brum. |
E, agora, ao completar dez anos de ausência, na volta à cena com a obra inédita AmazôniA, numa tríplice parceria
criativa incluindo, além do próprio João Wlamir, Jaime Bernardes e Mônica
Barbosa, com bravura e ousadia para enfrentar o desafio de tempos tão difíceis
para captação de patrocínios, especialmente para as artes cênicas.
Num valioso empenho pela descoberta de talentos emergentes para
integrarem, inicialmente, o novo staff da DC após uma década de sentido interregno.
Todos os oito bailarinos escolhidos, criteriosamente, em processo seletivo, seguindo-se um
extensivo período de preparação e ensaios, desde o inicio de 2024.
Desta vez, para tornar visível, cênica e gestualmente, uma
imersão na ambiência mágica da AmazôniA resignificada coreograficamente,
como emblemático signo pulmonar do mundo, na vastidão de seu verde florestal e
na potencialidade de maior reserva ecológica do planeta Terra.
Onde a paisagem cenográfica (Orlando Sérgio) tem um belo
alcance na abstrata representação plástica frontal de sua vegetação,
ampliando-se na habitual expressividade imprimida pelos efeitos luminares de
Paulo César Medeiros. Incidindo sobre a funcional tipicidade da indumentária (João
Paulo Bertini), com tons indigenistas, traços de folclorismo nortista e artesania
popular.
Havendo também a prevalência de sonoridades percussivas na
maioria das composições da trilha (Branco Ferreira), desde o ritualismo afro-indigenista, acentuado pelas
intervenções de um orixá, ao regionalismo
musical, com seu referencial de frases dos gêneros carimbó, sertanejo e forró. Além das citações de temas de Bethania,
Chico Science e até do Sepultura.
Os nove bailarinos, a maioria se destacando na fluidez de sua
corporeidade dançante, resultado natural de um elenco recém-formado, sob as exigências
maiores ou menores de certos quadros. Enquanto alguns demonstram ainda certa insegurança
em suas contrações performáticas, outros são mais incisivos em sua dramaturgia da fisicalidade.
O convicto comando concepcional da obra sem jamais perder a
singularidade da proposta de um vocabulário do movimento. Figurando situações
sócio-ambientais com personagens que remetem, tanto aos povos originários como
aos atuais segmentos populacionais, incluindo da diversidade sexual à
exploração insensata da própria floresta.
Onde a súbita mudança de compasso com a entrada, no epílogo,
das energizadas interveniências do minimalismo musical de Philip Glass, provocam um angustiado grito de alerta, palco/plateia,
e de denúncia global para que não se deixe perder, em carater definitivo, a urgente preservação da
poesia e da vida daquele Paraíso na Terra ...
Wagner Corrêa de Araújo