FOTOS/ELISA MENDES/RICARDO BRAJERTMAN |
Num embate artístico contra o preconceito moral e a marginalização
social estas metamorfoses da fisicalidade e dos desejos humanos ecoam no
referencial libertário do teórico Eugenio Barba, onde este corpo mutante é inserido no intrínseco
ofício do ator:
“Posto em forma,
reconstruído para a ficção teatral. Este corpo artístico – e logo não natural –
não é por si mesmo nem homem nem mulher. No palco tem o sexo que decidiu
representar”.
Mas, em ondas
contrárias , esta representação cênica das diferentes identidades sexuais foge do mero deboche e do riso mordaz provocados,
sempre, por uma burlesca comicidade deste surto psicótico dos desejos proibidos.
E ,no desdizer desta postura, há que se destacar o esforço gratificante e mais que meritório do projeto dramatúrgico idealizado por Márcia Zanelatto : Rio
Diversidade – Ocupação Fora do Armário. Que, iniciado em formato itinerante
no Castelinho do Flamengo, em 2016, retorna agora, na unicidade temporal e
física de um palco italiano e titulado como Ocupação Rio Diversidade.
Com quatro representativos nomes autorais na missão textual em torno da diversidade sexual,
acompanhados do mais qualitativo entre encenadores e intérpretes da cena
carioca. Camerístico quarteto de movimentos/ monólogos, com perceptíveis
acordes estéticos e incisiva sonoridade temática.
Em Genderless ,Um
Corpo Fora da Lei , com elegante sobriedade emotiva , Larissa Bracher se faz porta voz do nem masculino
/nem feminino, da metafórica genitália da pessoa australiana de Norrie May–Welby. Com autoridade cênica,
Guilherme Leme Garcia, em arrojado minimalismo cênico, transcendentaliza, a
interiorização poética e a contundência dramática do solilóquio de Márcia
Zanelatto.
Sem ter assumido o segredo de sua libido , impactada pela
ausência materna e a conivência de uma domesticidade felina, a tardia fuga do
armário de um personagem feminino, no desalento raivoso por dissimular a irresistível paixão por outra mulher . No
monólogo Como Deixar de Ser , em
idêntica coesão e luminosidade, a irradiante performance ( Kelzy Ecard), a densidade
textual (Daniela Pereira de Carvalho) e uma encenação artesanal(Renato
Carrera).
Vivenciando o limite do risco no intercambio do amor comprado, um amante do oficio criador e um garoto de programa, entre o interesse vil
e a morte indigna(no trágico referencial a Luiz Antônio Martinez Correa) .
Temas recorrentes de A Noite em Claro,
o corte laminar da narrativa (Joaquim Vicente) para duas pessoas a uma só voz. A direção
rompante e tensa de Cesar Augusto para uma valente, reveladora e cativante performance
(Thadeu Matos).
A verbalização fluente e de espontânea ironia no discurso, de intersexualidade híbrida, de Flor Carnívora (Jô Bilac). O contraponto crítico dos transes
humanos no universo vegetal , com senso rítmico e empatia pública na direção de Ivan Sugahara e a absoluta envolvência sensorial da
ritualística entrega de Gabriela Carneiro da Cunha.
Completando este memorial lúdico / verista das “grandes minorias” da Ocupação Rio
Diversidade, convicta como hostess,
a drag Magenta Dawning incendiando os
estereótipos preconceituosos. Todos, enfim, autores>atores>diretores,
inventariando a lição de Grotowski neste “ato de desnudar-se, rasgar a máscara
diária, a exteriorização do eu”...
Wagner Corrêa de Araújo
Wagner Corrêa de Araújo
OCUPAÇÃO RIO DIVERSIDADE está em cartaz no Teatro Sesi/Centro/RJ, quinta e sexta, às 19h30m;sábado, às 19h.110 minutos. Até 11 de fevereiro.
OCUPAÇÃO RIO DIVERSIDADE, em nova temporada, no Teatro Ipanema,sábado, às 21h;domingo e segunda, às 20hs. Até 14 de agosto.
OCUPAÇÃO RIO DIVERSIDADE, em nova temporada, no Teatro Ipanema,sábado, às 21h;domingo e segunda, às 20hs. Até 14 de agosto.