RIMSKY-KORSAKOV EM DOIS TEMPOS: COM UM OLHAR HISTORICISTA

FOTOS/JÚLIA RÓNAI

Duas obras artísticas, dois gêneros estéticos, da lavra de Nikolai Rimsky-Korsakof , integram o Projeto Ópera e Balé em Um Ato, da temporada 2016 do Theatro Municipal do Rio de Janeiro.

De um lado, o  retorno ao ideário do acervo operístico russo em sua busca pela pura identificação com a literatura nacionalista,em Mozart & Salieri, de 1897, a partir de um poema dramático de Pushkin (1830).

Em paralelo,  o primado da autenticidade na retomada de um dos momentos de apogeu dos Balés Russos de Sergei Diaghilev, com Sheherazade  , criação de Michel Fokine,1910, inspirada na suíte sinfônica homônima de 1880.

A ÓPERA: MOZART & SALIERI

Um programa com o olhar armado num enfoque historicista capaz de surpreender  mas também de intrigar o público (no caso específico da ópera),mal  acostumado à fissura de um repertório lírico tradicionalista e de prevalente apelo popular.

No que alude, então, a Mozart & Salieri ,presença rara até mesmo na temporada dos grandes teatros mundiais, há que se relevar a reação distante e fria ao final de sua apresentação. Afinal, são muitos anos de ausência, aqui, do melhor da criação operística russa, depois de um último Eugen Onéguin , em 1989.

Dificultada, ainda, pelo estranhamento da tradução brasileira numa ópera de potencial lastro e suporte na palavra literária original (Pushkin),em sua experimentação composicional/linguística como um “recitativo arioso”. E de substrato psicológico/introspectivo, na narrativa confessional do invejoso Salieri atormentado pela genialidade de Mozart.

Num dos papéis universalizados por  Fiodor Chaliapin, o personagem Salieri encontra em Inácio de Nonno , com sua significativa tessitura baixo/barítono, as necessárias  modulações  verbais/dramáticas. Com menor ressonância do fraseado discursivo na performance do tenor Flavio Leite(Mozart), de alcance vocal tímido diante das culminâncias sinfônicas.

O contraponto crítico diretorial de  Daniel Herz sabe como suprir a ausência do aquarelado exotismo sonoro, comum ao acervo operístico de Korsakov(especialmente, Sadko e O Galo de Ouro).Com a sutil intensificação da pulsão emotiva do ciúme de Salieri, duplicando (com integrantes do Coro do TM) o personagem Mozart nas passagens referenciais do seu Réquiem .

Amplificado pela irreverente forma de um  piano, de dimensionamento fantasioso, escorrendo pela ambiência doméstica de Salieri, em imaginativo desenho cenográfico(Fernando Mello da Costa) e elegantes figurinos(Marcelo Marques), ressaltados no desenho da luz de Aurélio de Simoni.

O BALÉ : SHEHERAZADE

Se na ópera Mozart & Salieri a escrita musical parece outonal, em seu soturno melodismo psicológico, a orquestração de colorido peculiar das óperas e criações sinfônicas de Rimsky-Korsakov, é imanente  na sua suíte em quatro movimentos, Sheherazade. Às quais  a competente regência de Tobias Volkman, frente à OSTM, empresta dignidade no confronto desta dupla particularidade estilística.

A  decoratividade da partitura exerce envolvência e magnetismo impar em  qualquer ouvinte, tornando, assim, maior o deleite visual da sua transposição por M. Fokine para os Balés Russos. Sua memorial estreia, em 1910, trouxe-lhe, também, os signos do sensualismo orientalista que atingia a música, o teatro e a literatura .

Com uma dose inusitada de volúpia e violência, no atrevimento sequencial de suas referências orgiásticas e de mortalidade. O que possibilitou a surpresa da auto sacralização de Nijinski  ao lado da irradiante atriz/bailarina Ida Rubinstein.

A reconstituição coreográfica do italiano Toni Candeloro tem competência artesanal e legado histórico, na precisa materialização dos efeitos visuais( a partir dos figurinos e cenários pioneiros de L. Bakst) e  na noção da dinâmica gestual.

Que é correspondida pelo Balé do TM no ardor de sua representação, com destaque para as cenas de conjunto com suas danças características, e nas pantomimas solos, de rigorosa expressão corporal e domínio dos papéis (Marcelo Misailidis, Anderson Dionísio e Toni Candeloro).

Onde o grande momento é o adagio  com seu pas-de-deux apaixonado, enquanto artistas e personagens, de Zobeida  a favorita do Sultão, e o Escravo Dourado.

De enérgica e sensorial fisicalidade com Cícero Gomes e de instintiva técnica e dramaticidade em Renata Tubarão. Quando, sem virtuosismos supérfluos, estabelecem, enfim, uma carismática e compensadora empatia com o público.

                                            Wagner Corrêa de Araújo



RIMSKY-KORSAKOV : ÓPERA E BALÉ EM UM ATO está em cartaz no Theatro Municipal/RJ, de quarta a sábado, 20h; domingo, 17h. 120 minutos. Até 02 de outubro.

     

ACORDA PRA CUSPIR : DELÍRIO E TRANSGRESSÃO

FOTOS/PRISCILA PRADE

O riso reside nas próprias atitudes  mecânicas dos gestos humanos, no pensar filosófico de Henri Bergson. E é esta verdade , de sarcástica poesia, que tem marcado os retratos cotidianos que o ator, dramaturgo e escritor Eric Bogosian traça em sua antologia  a que chamou de 100 Monólogos.

Dela fazem parte alguns dos mais viscerais textos de sua teatralidade como Acorda Pra Cuspir, versão brasileira de “Wake me up and smell the coffe” onde o autor radicaliza sua formatação monologal, já dissecada, entre nós, no seu provocante Sex, Drugs and Rock’n Roll e no questionador Talk Radio.

Este  performer/autor vem , desde os anos 80, incursionando  não só pelo teatro em criações personalistas, mas ainda integrando o elenco de notáveis obras fílmicas de Woody Allen, Robert Altman, Aton Egoyan, Agnieska Holland, entre outros.

Além de atuações em séries televisivas como Law & Order e da direção de um projeto de valoração documental das bases da dança contemporânea, indo de Balanchine a Bill T Jones e Karole Armitage. E, ainda, na polemização do genocídio armênio, a partir de suas raízes familiais, na ficcional Operação Nemesis.

Não é, portanto , fator de  espanto estas suas vinhetas cômicas revelarem, em seu irônico dimensionamento, o lastro psicológico de sua própria trajetória de celebridade artístico/existencial.

A contemporaneidade destes instantâneos flashes se faz presente na virulência de solilóquios voltados à desconstrução das pregações espiritualistas, em contraposição ao voraz sonho humano de  busca do sucesso pessoal e do patrimônio material.

O personagem/protagonista (Marcos Veras) está encarnado na insanidade dos inúmeros  José Silva que, no lugar comum de um dia-a-dia sem perspectivas, se auto vislumbram no paraíso dourado da fama. Atropelando tudo e todos, ainda que na vacuidade espiritual e na contramão de quaisquer princípios ético/morais.

Numa guinada abissal no seu contumaz humor descontraído e popular em formato stand up, aqui, Marcos Veras, em outra sintonia, destila um riso ácido, sarcástico, ferino, virulento, num palco/tribuna de linchamento do vir-a-ser da conterrânea condição humana.

A irracionalidade de sua personagem é materializada no onirismo da arquitetura cênica (Fernando Mello da Costa) com seus bonecos especulares do intérprete, sob luzes claro/escuras (Aurélio de Simoni),figurinos(Antonio Guedes)luminosos,trilha sólida(André Abujamra) e incisiva gestualidade ( Duda Maia) , visibilizando, em sensorial coesão, seu  caos interior. 

No seu habitual arrojo inventivo, Daniel Herz dá fluência emotiva e sustentação estética à performance solista de Veras, na perigosa narrativa monocórdia desta “comédia suja”. Sabendo imprimir contundência e tirar efeito dos vácuos e silêncios, no seu irreverente, delirante, seco, direto, mas reflexivo jogo teatral.




ACORDA PRA CUSPIR está em cartaz no Teatro Leblon, sexta e sábado, às 21h; domingo, às 20h. 70 minutos. Até 2 de outubro.

BLACKBIRD: QUANDO O SILÊNCIO É ROMPIDO

FOTOS/THAISA TRABALLI

Tema recorrente da literatura, do cinema e do teatro, a pedofilia ou esta paixão proibida entre idades diferentes nos limites da legalidade jurídica, tornou-se uma questão básica do universo psicopatológico , das análises primeiras de Freud à aplicação ao tema das teorias marxistas de Wilhelm Reich, chegando aos conceitos filosóficos de Michel Foucault do amor livre para qualquer geração.

Celebrizou romances como Lolita, de Vladimir Nabokov, quando um preceptor ama sua enteada ou instigou claras insinuações homoeróticas de relações juvenis nas narrativas de André Gide e Jean Genet ou no sutil disfarce literário de Thomas Mann, na obsessão de um escritor envelhecido pela beleza adolescente do Tadzio de Morte em Veneza.

Por outro lado, continua recheando as manchetes de jornais com pais ou padrastos seduzindo suas consortes ou padres e pastores em brincadeiras sexuais com seus aprendizes religiosos.

A pureza insegura de Una(Viviani Rayes), ninfeta de 12 anos no despertar adolescente, irrompe sobre Ray( Yashar Zambuzzi), um homem adulto e vinte anos mais velho , dos iniciais contatos virtuais a uma aproximação sexual de fato ,com sua posterior prisão.

Anos mais tarde, a partir de uma foto de jornal, o reencontro vítima/ algoz quebra o silêncio num complicado acerto de contas, trazendo risco para sua vida familiar refeita com direito a filha adolescente(Debora Ozório), de fugaz mas esclarecedora presença cênica no epílogo .

O texto do inglês David Harrower – Blackbird , numa referencia titular homônima a um clássico da canção jazzística, é inspirado num episódio real onde os protagonistas são um fuzileiro americano e uma jovem britânica, e alcançou o gosto das plateias e o aplauso crítico levando, em 2006, o prêmio Laurence Olivier.

Até que ponto são eles culpados quando se percebe o confronto do desejo obsessivo de um homem de meia idade com a ingênua perversidade de uma garota de 12 anos, de sexo à flor da pele?

O clima é acentuado com a contundência da cenografia claustrofóbica( Pati Faedo) de acertada luz claro escura(Elisa Tandeta) ,acompanhada da incidental trilha sonora de Marcelo Alonso Neves.


E tem ,em sua versão brasileira, o senso estético apurado de Bruce Gomlevsky ,que estabelece um inquisitivo jogo de dados e apostas – palco/plateia - no desenrolar dos intrigantes diálogos/duelos , com impulsivas jogadas verbais e acertados lances performáticos dos personagens.

                                                Wagner Corrêa de Araújo



BLACKBIRD em nova temporada no Teatro Dulcina, Centro/RJ, quarta a domingo, às 19h. 80 minutos. Até 02 de abril.

BOA NOITE, PROFESSOR : SOB UM JOGO DE INTIMIDAÇÃO

FOTOS/GUGA MELGAR
Sob o justo mote comemorativo dos 65 anos do Tablado, baluarte histórico de formação e  de  provas de amor ao teatro, no seu retorno à grade de programação dos palcos cariocas , um valoroso exemplar autoral de dois integrantes de seus quadros curriculares – Lionel Fischer e Júlia Stockler – “Boa Noite,Professor”.

Quando os quarenta espectadores, longe da plateia,  aguardam, no posicionamento circular da essencialista urdidura cenográfica(José Dias), representativa da ambiência doméstica do professor Paulo (Ricardo Kosovski), a chegada da estudante Verônica(Nina Reis), nem de longe imaginam onde levará esta ilusória dualidade lúdica de personagens.

Perante um aparente confronto corriqueiro de questionamentos escolares, a partir de  uma tese que a aluna idealiza sobre o universo da psicopatia, através de uma consulta professoral, o sequencial narrativo dá uma surpreendente  curva transgressiva.

Em que desabam os previsíveis impulsos de uma mera atratividade sexual , o mais comum a se esperar destas  atrações secretas entre os dois polos humanos , afetividade e ensino , numa sala de aula.

Com tensão e suspeita vai se delineando uma trama dramatúrgica de rascante dimensionamento psicológico em suas ramificações psíquicas, nas decorrências  de um misterioso crime e da maldade indômita de um provável serial killer.

Na precisa e inteligente  escrita da dupla de dramaturgos (pai e filha, na vida real) , delineia-se , com irônica clareza, o temperamento charmoso e eloquente, típico deste perfil psicopata. Explorado com a necessária frieza,  paralela a uma vigorosa espontaneidade, emotiva e gestual, no  que condiz ao personagem de  Ricardo Kosovski, em irrepreensível performance.

Por outro lado, em idêntica coesão e indisfarçável contundência, Nina Reis avança na sensível captura de sua personificação onde , através de subentendidos e lance de dados instintivos, sem jamais tropeçar em estereótipos, conduz à inesperada solução final.

Este teatro psicológico e simultaneamente terapêutico, com seu entrecho subliminar de catártica redenção, é favorecido pela maestria diretorial  com que é manipulado a quatro mãos ( Lionel Fischer/Júlia Stockler).

E este pleno domínio da representação, é ampliado  pelo acerto no comedimento de seus mecanismos técnico/artísticos , da cenografia de Dias aos figurinos   (Ana Carolina Lopes) e na suavidade de seu desenho de luz(Aurélio de Simoni), passando, ainda, pela sutileza incidental de seu score sonoro( Tato Taborda).

Boa Noite, Professor é, assim, um espetáculo corajoso por sua verdade subjetiva e revelador por  sua sustentação crítica.



BOA NOITE, PROFESSOR está em cartaz no Teatro Tablado, Lagoa/RJ,sexta e sábado, 21h;domingo, às 20h. Até 25 de setembro. 

LOVE STORY - O MUSICAL : COM UMA FURTIVA LÁGRIMA

FOTOS/GUSTAVO BAKR

O que dizer de uma garota que gostava de Beatles e Bach e morreu aos 25 anos?”. Já no prólogo de Love Story – O Musical, uma antevisão  de um drama sentimental com direito a uma torrente lacrimosa. Como  em 1970, na sua versão original, simultaneamente, para o livro(Erich Segal) e para a tela(Arthur Hiller).

No pós-quatro décadas , a história renasce como melodrama, no musical inglês da dupla Stephen Clark e Howard Goodall ,em temporada no West End de Londres(2010), e, agora, na versão brasileira sob a dupla lavra de Artur  Xexéo( texto) e Tadeu Aguiar (concepção diretorial).

Jenny (Kacau Gomes),menina simples de Nova York, filha de imigrantes italianos e estudante de música erudita , acaba se casando com Oliver(Fábio Ventura), aluno de direito em Harvard e de uma família de posses que se opõe ao relacionamento. Mas esta paixão novelesca é interrompida, prematura e tragicamente, por uma doença terminal.

Aqui, muitos duetos  da dupla amorosa revelam o empenho emotivo/técnico do casal protagonista, com maior fluência interpretativa e arrojo vocal na atuação presencial de Kacau Gomes que na discricionária ousadia de Fábio Ventura.

Nos papéis coadjuvantes, destaca-se  o Senhor Cavilleri (Sérgio Menezes), como o espontâneo  e vivaz pai de Jenny, em consistente performance aliada à simpática atuação de Ester Freitas como sua mulher. Além de Ronnie Marruda (o pai de Oliver) e que, praticamente, não tem nenhuma chance para exibir seus anteriores dotes de cantor.

Completam o elenco , outros  seis atores/cantores/bailarinos, com melhores possibilidades em cenas de conjunto e alguns raros e pouco notáveis solos musicais.

E enquanto a coreografia( Alan Resende) apenas preenche o espaço cênico em seu extremado comedimento, há um apuro no comando musical ( Liliane Secco) de vozes, ao lado de  um septeto de piano e cordas.

De profissional execução e sotaque camerístico, ainda que o score soe quase monocórdio na prevalência de  seus acordes de melosa romantização. Mas de enérgica excepcionalidade na cena do jantar italiano(Pasta), com seu referencial/ tributo a uma passagem ( Spaghetti) das operetas da dupla vitoriana Gilbert and Sullivan.

Suprindo a previsibilidade de uma  trama dramatúrgica melancólica, na sua íngreme missão de provocar pelo menos uma furtiva lágrima, há um irradiante aparato cenográfico (Edward Monteiro). Que na sua articulada mutabilidade  tem sintonia no desenho da iluminação (Aurélio di Simoni), ressaltando, também, um acordo com os tons aquarelados do figurino( Ney Madeira/Dani Vidal).

A tradução (A. Xexéo),com sua leve nuance irônica, dá suporte à saída eficaz e inteligente de Tadeu Aguiar na idealizada tessitura de um black musical, como substitutivo crítico de uma retomada temática, de lirismo anacrônico e de lugares comuns amorosos.

Mas capaz, ainda assim, de transmutar, com brio e envergadura, esta superficialidade folhetinesca, em mais uma generosa contribuição ao desenvolvimento do teatro musical brasileiro.


LOVE STORY-O MUSICAL está em cartaz no Teatro Fashion Mall/São Conrado, sexta e sábado, às 21h;domingo,às 20h. 90 minutos . Até 23 de outubro.

CASA DE BONECAS : RESISTÊNCIA ICÔNICA

FOTOS/ MARIANA BASSOUL

“Meu dever, meu sagrado dever é em relação a mim mesma”. As palavras finais de Nora se tornaram carismáticas na luta pela emancipação da mulher e por sua busca pela equiparação com os direitos masculinos.

Desde sua estreia em 1879, quando deflagrou o início de uma revolução moral e social em meio à censura e protestos, Casa de Bonecas, de Henrik Ibsen, antecipou , com seus anseios libertários, outro célebre personagem feminino do dramaturgo – Hedda Gabler (1890).

Mas se para Hedda a única saída é  a do suicídio, a rebeldia de Nora se prolonga, no abandono do lar, do marido e dos filhos, com a busca de novas perspectivas e contra a mesmice das conveniências domésticas.

E é a densidade psicológica de um drama interior de opressão da protagonista feminina que é refletido até a contemporaneidade, com a persistência de  um lastro ancestral de reclusão da mulher nos limites intransponíveis das funções exclusivas de esposa e de mãe.

A versão do teatrólogo argentino Daniel Veronese, denominada como “El Desarrollo de la Civilización Venidera”, procura retomar o tema com o olhar armado nos embates sociais de nossos dias . Onde, ainda, são possíveis muitas “Noras”, impedidas de irem à luta pela resistência de preconceitos centenários.

Se  esta Casa de Bonecas ( a versão brasileira retoma o título clássico) é uma cópia narrativa quase perfeita do original norueguês, nela a maior radicalização aparece numa proposital concisão do texto. Que, por outro lado, ocasiona, com isto , um certo prejuízo no diagnóstico, de aprofundada interiorização , da teatralidade de Ibsen.

Aqui, a concepção cenográfica( Franco Battista/Ariel Vaccaro) não sugere nenhum vínculo, na aridez minimalista de uma sala de visitas, com uma ambiência familiar em processo de desmoronamento. E o desenho de luz  (Gonzalo Martinez)branca  , vazado e sem nuances, também,  pouco contribui.

Mas o irradiante contraste entre as atitudes ingênuas de uma Nora (Miriam Freeland, em vigorosa atuação), como brinquedo/objeto sob as rédeas do marido Torwald, e sua progressiva insubmissão, tem um luminar retorno na espontaneidade das variações temperamentais de Roberto Bomtempo.

Com maior  sobriedade, diante da força emotiva e sensorial dos personagens de Nora e Torwald, são convincentes  as presenças do elenco complementar. Com simpatia e amadurecimento em Regina Sampaio e maior acomodação na composição dos papéis de Anna Sant’Anna e Leandro Baumgratz.

E um empenho artesanal da dupla direção ( Roberto Bomtempo/Symone Strobel) superando quaisquer obstáculos , com a valoração do texto e o fluente e seguro tom estético exploratório da performance. Capaz , enfim, de materializar o alcance dimensional desta reapresentação dramática de um ícone do teatro universal.


CASA DE BONECAS está em cartaz no Teatro Cândido Mendes, Ipanema, de quinta a sábado, às 21h; domingo,às 19h. 70 minutos. Até 18 de dezembro..

DANÇA SINFÔNICA E LECUONA: RIGOR E PAIXÃO

FOTOS/ JOSÉ LUIZ PEDERNEIRAS

   
Nas quatro décadas da vitoriosa trajetória do Grupo Corpo raros foram os anos em que a Cia não revelou uma coreografia inédita que, por uma tradição cênica, sempre foi apresentada em paralelo a uma criação antecedente.

Fator que nunca gerou qualquer incomodo tanto para o público como para a crítica pois, ao contrário, acabou, sim, possibilitando um entusiástico e singularizado impulso comparativo da evolução de sua proposta estética.

Por outro aspecto, o Corpo tem um alcance inventivo ímpar na sua linguagem artística tendo, neste quase meio século de ininterrupta atuação, se pautado pela valorização do substrato nativo. E dando prevalência a nossos compositores com apuradas recriações musicais pensadas,coreograficamente, como um corpo único,indivisível, mimético.

Destacando-se, ainda, pela reinvenção das danças populares, tanto as nacionalistas, como aquelas que integram o inventário das danças de salão, da valsa ao tango e ao bolero, como na obra Lecuona, de 2004 e que está sendo reapresentada junto à Dança Sinfônica de 2015.

Com sua inspirada partitura de Marco Antônio Guimarães, entre a solenidade barroquista e as pulsões da contemporaneidade, Dança Sinfônica , nas suas construções gestualistas, entre a rigidez hierática e a soltura física, alcança ricos contrastes coreográficos.

Capazes de transmutarem-se ora em superlativo dinamismo nos quartetos e trios,ora em extasíaco lirismo nos pas-de-deux, de Sílvia Gaspar com Edmárcio Júnior e Helbert Pimenta.

Pouco conhecido no Brasil, salvo raras incursões como a de Caetano Veloso em Fina Estampa, o acervo  musical do cubano Ernesto Lecuona(1895/1963) , com mais de quatrocentos títulos, inclui canções e  trilhas para o cinema americano e até um Oscar.

Paixão e sensualidade, domínio e submissão, amor e abandono, lembrança e melancolia, guiam este encontro de casais em seus duos de boleros, tangos e valsas, numa coreografia/tributo  - Lecuona, criada em 2004.

Como em Dança Sinfônica, há, aqui, uma prevalência de tons sanguíneos e negros nos figurinos (Freusa Zechmeister), para acentuar os transes das paixões amorosas.

Quebrados ora por cores aquareladas , num essencialista aporte cenográfico com luzes brancas(na dupla concepção de Paulo Pederneiras), de acentuação plástica do entrelaçar-se da fisicalidade dos bailarinos.

Nestes doze pas-de-deux, com sua carga de melodramáticos impulsos amorosos, a criação de Rodrigo Pederneiras traduz , com elegância técnica e carisma interpretativo, este contraponto afetivo.

Que culmina na engenhosidade, de forte carga estética/emotiva,da envolvência de todo elenco como se fosse um só corpo e um só casal , ecoando , nesta valsa final, com seu poético reflexo de extensão especular, outra vez, o pensar lamentoso de Lecuona:

“...No vivo desde aquel dia em que te vi/Porque nunca he dejado de pensar em ti”.

                                 WAGNER CORRÊA DE ARAÚJO


O GRUPO CORPO está se apresentando no Theatro Municipal/RJ, de quinta  a sábado e segunda, às 20h; domingo, às 17h. Até 19 de setembro.

MIMULUS : MEMORIAL COREOGRÁFICO

FOTOS/ GUTO MUNIZ

Desde os anos noventa, a Mimulus Cia de Dança vem priorizando uma proposta singular de retomada do tradicional repertório das danças de salão  mas sempre com o olhar armado na contemporaneidade.

Em seu lastro original da mineiridade,  também como o Grupo Corpo, a sua base de apoio é  Belo Horizonte, de onde vem irradiando seu ideal coreográfico de redescoberta inventiva de uma  dança popular de raízes brasileiras.

Na sua  mais recente criação - Pretérito Imperfeito - a Cia faz uma espécie de inventário estético de sua trajetória num mergulho memorialístico. Uma prestação de contas sobre seu acervo artístico num elo especular  ,entre pesos e medidas, sobre os resultados desta  sua verve investigativa.

O espetáculo é marcado, inicialmente,  por signos indicadores da passagem das horas – metrônomos, ampulhetas,  relógios,  álbuns de retratos ou janelas abertas a uma paisagem de recordações - sutis mas pesarosos desnudadores desta fugaz temporalidade do “Pretérito Imperfeito” de todos nós.

Ratificado, metaforicamente,  por uma trilha musical centenária que inclui, entre outros, Ernesto Nazareth, Pixinguinha, Ary Barroso, Alberto Nepomuceno, Villa-Lobos,  contrapondo, em inspirados arranjos camerísticos, o popular e o clássico,  a ancestralidade e os novos valores.

Esta reidentificação com a lembrança e a memória refaz as trilhas percorridas, num nostálgico  mas lúdico conluio entre o ontem e o hoje, entre os bailarinos  e o público, no registro de recados em papeis fragmentados e que, unidos plasticamente, compõe um sensorial mural cenográfico.

Num recorte das danças urbanas, da domesticidade dos saraus familiares às confraternizações sociais dos bailes, com seu vocabulário próprio  de prevalência de duos ou casais , mas  com um feeling diferenciado e enérgico nas linhas coreográficas de Jomar Mesquita.

Danças, ora cadenciadas em prazerosa e pulsante gestualidade corporal, ora de melancolizada envolvência ou de  sensível espontaneidade como na bela transcrição de um  romantizado Villa Lobos,  na   Valsa da Dor. Sustentada sempre em recatado aporte cênico, com  figurinos(Baby Mesquita) de beleza cotidiana e luzes ambientalistas (Ed Andrade).

Cumprem, aqui, estas figuras dançantes (Andrea Pinheiro/Jomar Mesquita/Juliana Macedo/Lorena Tófani/Murilo Borges/Rodrigo de Castro/Rodrigo Schifini/Sofia Gonzalez) , na sua apurada entrega interpretativa, um lavor técnico/reflexivo. 

Transcendendo, assim, os limites do  tempo verbal deste Pretérito Imperfeito, em significante devir artístico e existencial.


MIMULUS CIA DE DANÇA , apresentou-se no Theatro Municipal RJ, sábado, 10 de setembro, às 20h, com o espetáculo PRETÉRITO IMPERFEITO, seguindo em temporada nacional.

PAPAI ESTÁ NA ATLÂNTIDA : INFÂNCIA PARTIDA

FOTOS/LUIZ LUZ

A tão rara presença da dramaturgia latino-americana nos palcos cariocas tem, agora, através da Tentáculos Espetáculos um notável exemplo qualitativo com a premiada peça do mexicano Javier Malpica – Papai Está na Atlântida.

Depois da conceitual  montagem do texto do venezuelano  Gustavo Ott – Dois Amores e um Bicho, é a vez de uma oportuna obra mexicana que,  no seu incursionar pelo lado negro e da xenofobia no fator migratório, desnuda o desprezo e a marginalização da condição humana.

Aqui, neste texto de 2005, precursor, na sua  simbologia, da cruel vitimização da infância - de perceptível  marca trágica em nossos dias, dois pequenos irmãos refugiam-se num sonho utópico,  diante da  ida paterna ,sem volta,  para os Estados Unidos.

E é assim que se iludem com o pensar de que o pai , em verdade, teria partido para uma cidade mítica - a desaparecida Atlântida. Como um fugaz consolo pela obrigação incomoda de condenados à solidão em terreno limítrofe,  sob os ditames de uma  avó que a eles pouco importa.

Enquanto personagens irmãs, Daniel Archangelo assume o papel do primogênito, na insegurança de suas certezas pontuadas de ironias, e  Ricardo Gonçalves personifica a fragilidade do caçula, com seus acessos de pânico, entre o espanto e a dor. Na cruel ambiguidade de seres fissurados pelos embaraços do distanciamento de suas raízes domésticas e familiares.

E é esta submissão a uma esperança perdida, no lastro memorialístico  dos mais íntimos desejos e valorações da infância, que se estrutura uma narrativa  entre o lirismo e o desespero.

Onde o grande lance estético de um núcleo de trama simples é o lúdico jogo, de sóbria  linha interpretativa,sem quaisquer artificialismos, de atores adultos visibilizando atitudes  e exteriorizando diálogos infantis.

Este contraponto afetivo dá luminosa  autoridade cênica a um espetáculo de prevalência da palavra  diante de uma recatada essencialidade  cenográfica(na dupla concepção  de Guilherme Delgado e Ricardo Rocha, este ultimo também autor dos figurinos).Através da  mobilidade inventiva de  bancos de madeira impulsionando singularizadas  ambientações.

Enriquecido, ainda  pela sutil poesia plástica do desenho de luz(Luiz Paulo Barreto) capaz de imprimir, na entrega à fisicalidade pelos atores,  a metafórica visualização da densidade psicológica  imanente à suas ingênuas mas emotivas textualizações.

E ainda que paire a ameaça de quebra rítmica na progressão dramática de um discurso quase reiterativo, as mãos firmes de Guilherme Delgado revelam  folego e maturidade na  decifração desta gramática cênica que surpreende, enfim,  com sua significante  pulsão reflexiva.


 PAPAI ESTÁ NA ATLÂNTIDA está em cartaz no Teatro Eva Herz, Centro/RJ, de quinta a sábado, às 19h. 80 minutos. Até 17 de setembro.

O HOMEM ELEFANTE : TEATRO DA CRUELDADE E DA COMPAIXÃO

FOTOS/RODRIGO CASTRO


A Cia Aberta , em seus três anos de atuação na cena carioca, vem se destacando pelo inusitado de suas propostas, em montagens teatrais que conduzem ao questionamento filosófico , como na abordagem estética da solidão em “Farnese da Saudade” e da dor existencial em “Vermelho Amargo”.

A Cia está, agora, de volta com sua investigativa leitura de "O Homem Elefante”, inspirada no tríptico – a peça de Bernard Pomerance, o filme de David Lynch e o livro de Frederick Treves.

O tema original se apoia na veracidade da existência de um ser disforme John Merrick, na segunda metade do século XIX , transformado em atração dos “freak shows”, exibicionismo de aberrações para as classes proletárias da Londres vitoriana.

Acometido por uma estranha doença genética, tornou-se um paradigma da bizarrice da imagem humana , provocando o deboche e o riso cruel das audiências, até ser resgatado pela piedade de um médico, para estudos de anatomia em um hospital.

Nesta trajetória de análise clínica, o “homem elefante”, num processo de auto descobrimento e de revelação da sensibilidade ,descobre , além da terrífica imagem, que é afinal um ser humano capaz ,inclusive, de se apaixonar .

A proposta da direção de Cibele Forjaz, ao lado de Wagner Antônio, se apoia no dinamismo cênico com uma sutil e indagativa referência ao “Grand Guignol”, teatro francês de exploração do horror naturalista.

Desde uma claustrofóbica ante-sala do teatro onde o público é incitado, pela astuciosa envolvência do condutor Ross(Daniel Carvalho Faria), a ingressar neste recinto de medo e pesadelo quando a cortina vermelha subir, até o aparecimento do carismático protagonista o homem elefante(Vandré Silveira).

Na ação dividida entre dois palcos – do submundo ao hospitalar, enriquecida pelo convincente tom de recato do doutor Treves(Davi de Carvalho) e da intensidade emotiva da senhora Kendall(Regina França), uma apurada adequação cenográfica(Aurora dos Campos) e a ambientalista iluminação de Wagner Antônio.

Para o público, ao final ,caberia uma reflexiva constatação:

se não ficássemos presos aos padrões culturais das aparências, poderíamos, talvez, sentir que a angústia por trás das deformidades humanas é mais digna ,parodiando Shakespeare, do que “um individuo que pode sorrir, sorrir , e ser um vilão”.



O HOMEM ELEFANTE está em cartaz no Centro Compartilhado de Criação, Barra Funda, São Paulo. Quinta, sexta, sábado e segunda, às 21h;domingo, às 20h. 100 minutos. Até 3 de outubro.


SELFIE: NARCÍSICA VIRTUALIDADE


FOTOS/SÉRGIO BAIA

O mítico Narciso está de volta , presente , quase como elo propulsor inconsciente no universo da cibercultura, com a especular postagem, textual e visual ,de vidas privadas nas redes sociais.

Diante da solidão e da incomunicabilidade da realidade tecnológica contemporânea, enclausurados nos bunkers domésticos da mídia virtual, há uma catártico anseio destes "narcisos" serem identificados e admirados pela "beleza " de seus auto - retratos no cotidiano. Sempre compartilhados, sem limites e disfarces, entre seus iguais.

Quando “Selfie”, o oportuno texto dramatúrgico de Daniela Ocampo, ironiza a memória humana armazenada em computadores, ao mesmo tempo, acerta ao aliar o riso ao questionamento filosófico deste traço da nossa contemporaneidade.

Impulsionado, ainda, pelo olhar armado da direção ( Marcos Caruso) no alcance do ponto exato de equilíbrio, entre o humor inteligente e a dimensão estética, direcionados à interatividade lúdica e reflexiva da platéia.

E é nesta realidade cibernética que Cláudio( Mateus Solano) encontra seu própria razão de existir, até o momento em que perde todo o seu referencial biográfico/social numa pane de seus computadores.

Sai, então, pela recomposição de seus dados, ao reencontro de onze personagens desconectados, todos protagonizados por um mesmo ator (Miguel Thiré).

Na intencional performance com nuances de pantomima, os dois atores se destacam pelo versátil uso de recursos óticos e auditivos, além da loquacidade verbal ideal.

Ressaltados pela uniformidade dos figurinos(Sol Azulay ), pelo original score sonoro( Lincoln Vargas) e movimentação corporal(Arlindo Teixeira), além de uma iluminação quase cinema(Felipe Lourenço).

Falando ao olhos pela força mimética da dupla performance, na sua proximidade com o gestual burlesco, Selfie remete a um mix da linguagem chapliniana e do design fílmico de Jacques Tati.

Atingindo, enfim, a simbológica contradição das viagens internáuticas, no seu visível superficialismo virtual externo e no vazio vaidoso do “selfie” , capaz apenas de nos fazer apaixonar pela visualizante imagem de nós mesmos.


SELFIE está em cartaz no Teatro Renaissance,Jardins,São Paulo, sextas às 21h30m: sábados, às 20h30m e 22h30m; domingos, às 18h3om. 70 minutos. Até 18 de Dezembro.

CLARICE LISPECTOR & EU : METAFÓRICA & POÉTICA IDENTIDADE

FOTOS/DANIEL MATTAR

A complexa interiorização do universo de Clarice Lispector se manifesta no reinventar a presença dramatúrgica da escritora, dividindo o seu “estar só”, na visível  escuta de seu silêncio pelo  outro, além do palco.

Este universo literário teatralizado vem deixando um precioso inventário estético/ memorialístico. Formatado especialmente em solilóquios/monólogos que vão, entre outras  incursões ,  de Beth Goulart  e Esther Jablonski a Rita Elmôr .

Quando, há dezoito anos, Rita Elmôr surpreendeu a cena carioca com sua envolvente busca de uma resposta ao metafísico questionar-se de Clarice – “Eu sou um mistério para mim” – ficou marcada ainda pela incrível similaridade física com a escritora.

E, assim, depois da performance primeira de 1998 em “Que Mistérios Tem Clarice” , ela retoma, agora, sua exteriorização das vivências de uma representação, entre  vida e  mito,  verdade e performance, na desafiante fisicalidade de uma metafórica escrita.

Desta vez, em “Clarice Lispector & Eu – O Mundo Não É Chato”, Rita Elmôr transcende a fórmula inicial, misturando fragmentos da escritora com suas próprias reflexões , num espetáculo revelador em sua sobriedade e despretensão.

A atriz , no  uso inteligente de sua semelhança visual com Clarice, faz uma entrega absoluta a esta personificação. Em linha dramática quase pirandelliana , na sua conduta  de mistura de identidade com a personagem assumida.

É como se Rita/Clarice fossem uma só, neste fluxo de frases entre a dramaturgia autoral e referencial literário,  entre o “deixo-te ser”  e o “deixa-me ser “. E é esta troca, de poéticos subentendidos, que faz irradiar a magia da proposta.

A prevalência do sensorial tem seu alcance ampliado nos achados singulares das fotos  de Clarice/ Rita projetadas ao fundo e no bom gosto do figurino (Mel Akerman). Além do minimalismo  da composição cenográfica e dos efeitos visuais, entre sombras e luzes (na dupla concepção de Paulo Denizot).

Onde um núcleo de  trama simples, concisa e consistente, conduzida pela direção artesanal  de  Rubens Camelo, tem no sutil contraponto da intérprete e da personagem, um tom confessional  pontuado entre o lírico humor e a verdade interior.

Capaz , enfim, de estabelecer carisma e  empatia com o público numa das mais sensíveis gramáticas cênicas da atual temporada.



CLARICE LISPECTOR E EU - O MUNDO NÃO É CHATO está em cartaz no Teatro Poeirinha,de quinta a sábado, às 21h;domingo,às 19h. 60 minutos. Até 30 de outubro.


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