FOTOS/RENATO KRUEGER |
Ao lado das emblemáticas peças que uniram a estética de Anton
Tchekhov às teorizações de Stanislavsky , há uma recanto singularizado, sempre com extremado apelo inventivo, tanto
na sua obra ficcional como dramatúrgica, com os contos e peças de pequena dimensão.
É o caso de O Canto do
Cisne , de 1888, e de Os Malefícios do Tabaco, iniciada em 1886 e
só concluída, em sua versão definitiva, em 1903. Planejada exclusivamente em
formato de monólogo, ao contrário da primeira, mesmo com seu protagonismo
quase absoluto, permite sutis interferências de um segundo personagem , na
pitoresca figuração do ponto teatral.
Ao reunir os dois textos sob a titulação de Nada, a teatralidade assumida pela
concepção diretora de Gilberto Gawronski dá–lhe um original tratamento ao inserir
passagens significativas , não só dos quatro grandes clássicos da criação
tchekoviana (O Jardim das Cerejeiras, As
Três Irmãs, Tio Vânia, A Gaivota), como de citações de Shakespeare e Tennessee Williams.
O que possibilita uma transcendente incursão no universo
autoral de Tchekhov ao tornar prevalente
a inserção sujeito-objeto, performer-espectador, na magia do ritual cênico, num
paralelo de desmistificação e desnudamento do ator enquanto artista e enquanto
homem.
Não só por sua ausência
temática especialmente em O Canto do Cisne, no ato visualizador de um teatro vazio, como no próprio
questionamento irônico da interação palco/plateia do personagem/ator( Analu
Prestes) na amarga constatação de que é como
se tudo não passasse , como a própria vida, de “um divertimento frívolo”.
Explícito, também, na visceral e tragicômica representatividade de
um palestrante sobre os Malefícios do
Tabaco quando esta personificação confunde os limites confessionais do
papel, assumido ficcionalmente, com um
verista auto - retrato existencial das
próprias atrizes (Analu Prestes e Clarisse Derzié). Completado
na episódica invasão performática do iluminador/designer videografista Renato Krueger.
Aqui, ampliado ainda na incisiva e sensorial transmutação metafórica
da identidade sexual, entre o masculino e o feminino, entre o ser personagem e o ser humano, enfim num dimensionamento psicológico/filosófico, entre o teatro e
a vida.
Neste domínio de uma potencial gramática cênica , o ofício
diretorial de Gilberto Gawronski explora, assim, os recursos histriônicos e
dramáticos e a instintiva espontaneidade das duas atrizes. Apesar mesmo de um
espaço maior para o protagonismo convicto, elegante e ardoroso de Analu Prestes, havendo ali o amadurecido , contundente e necessário contraponto
crítico de Clarisse Derzié.
Onde, na simplicidade funcional dos elementos técnico/artísticos
de cenografia e desenho de luz (chancelados também por Gawronski) , é surpreendente, também, a pulsão emotiva pelo uso de simbólicos figurinos do acervo de Marília Pera.
O que, em tempos de nebulosidade política e incerteza de
recursos para projetos artísticos, para afastar o fantasma do derrotismo, nos
leva a sintonizar, em unicidade vocal com Renata Sorrah(ao agradecer a homenagem da recente premiação da APTR),as
sábias e oportunas palavras de Tchekhov :
“É preciso sempre trabalhar, trabalhar, trabalhar...”
Wagner Corrêa de Araújo
NADA está em cartaz no Teatro Poeira/Botafogo, terça e quarta, às 21h. 60 minutos. Até 26 de abril.
NOVA TEMPORADA, no Teatro Dulcina/Centro/RJ, sábado e domingo, às 19h. 70 minutos. Até 30 de julho.
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