ÁGUA DE MENINOS / CIA BALLET DALAL ACHCAR : PARTITURA INÉDITA DE TOM JOBIM INSPIRA OS PALCOS COREOGRÁFICOS



Água de Meninos Fantasia Poética em Dois Atos. Dalal Achcar/Éric Frédéric/Concepção Coreográfica/Direcional. Cia Ballet Dalal Achcar. Dezembro/2025. Laura Fragoso/Fotos.
 


Sessenta anos depois, a bailarina e coreógrafa Dalal Achar retoma um original projeto coreográfico com o qual sonhara durante o apogeu da Bossa Nova. Ideário até então esquecido pela passagem do tempo e que fora resultado de um destes memoráveis acasos artísticos do destino - o balé Água de Meninos Fantasia Poética em Dois Atos.

Todas estas acontecências naquele emblemático cruzamento de esquina, entre as ruas Montenegro e Prudente de Moraes, no bar Veloso (o futuro Garota de Ipanema) ponto preferencial de encontros entre o músico Tom Jobim e o poeta Vinicius de Morais, numa quase proximidade da casa do compositor e do Estúdio de Dança Dalal Achcar.

Para onde, costumeiramente, se dirigiam no pós-horário de funcionamento, por uma deferência especial de Dalal, amiga familiar de longa data de Vinícius, para rascunharem  nas teclas do piano, os acordes e as letras de algumas daquelas canções referenciais da dupla e do gênero bossa nova .

Dalal que muitas vezes ficava por ali, imersa no encantamento das inspiradas melodias, acabou pedindo a Tom se este não se animaria a escrever uma partitura especial para sua Cia. O que afinal ocorreu, quando entregou aquela tão desejada trilha, sob  temas autorais e citações de clássicos da MPB, já pronta incluídos os arranjos orquestrais por Radamés Gnattali.


Água de Meninos-Fantasia Poética em Dois Atos. Companhia Ballet Dalal Achcar. Bailarino Manoel Francisco no papel de Tom Jobim. Dezembro/2025. Laura Fragoso/Fotos.


O que, agora, faz Dalal Achcar retomar de forma entusiástica sua criação coreográfica, depois de um interregno de vinte anos, numa parceria valiosa com o também coreógrafo e atual Maître de Ballet de sua Cia e de seu estúdio - Éric Frédéric. Contando com um argumento narrativo do experiente ator, dramaturgo, tradutor e escritor Eduardo Rieche.

Reunindo, além de um extenso cast de bailarinos, integrantes oficiais da Cia, a participação de convidados super especiais, afinada equipe tecno-artística que confere ao espetáculo uma potencial categoria. A começar do preenchimento da caixa cênica (Marieta Spada) com a plasticidade simbólica de telões frontais que conceitualizam uma tipicidade pictórica ora carioca, ora baiana, a partir de traços de telas dos artistas Glauco Rodrigues, Israel Pedrosa e Carybé.

Ampliada na dúplice apropriação dos figurinos por Dani Vidal e Ney Madeira, indo do sotaque cotidiano em trajes e malhas ao colorido folclórico, em inserções que conectam figuras clássicas da mitologia ao candomblé, como Iemanjá, ressaltadas por expansivos efeitos luminares  (Felício Mafra).

Completando-se na orquestração original (Radamés Gnattali), sob  releitura e regência, e, desta vez, por outro continuador dos atributos musicais da família - Roberto Gnattali, sinalizada por acordes sinfônicos melodiosos, entremeados por energizadas passagens rítmicas, numa rica instrumentação valendo-se de cordas, sopros, teclados e percussões. 

Na incorporação de personagens fundamentais para o dimensionamento de um teatro coreográfico, a presença de nomes significativos ao universo da dança clássica em moldes brasileiros, entre estes os bailarinos  Claudia Mota  (Dalal) e Manoel Francisco (Tom Jobim), sem deixar de mencionar aqui a representante de outra geração Irene Orazem, no papel de Madame Makarova.

A concepção coreográfica de Dalal Achcar, sintonizada entre a tradição da base acadêmica e a modernidade, destaca-se pelo sotaque neoclássico no entremeio de uma corporeidade dançante plena de autenticidade em seu diálogo com o legado afro-brasileiro, neste formato tornando-se mais proeminente o vocabulário de movimento do segundo ato.

A unicidade do corpo cênico dançante, sempre direcionada por uma expressiva gestualidade, destacando-se desde a precisão sensitiva das pontas à entrega performática a uma vigorosa contração da muscularidade nas danças com caracteres populares.

Num absoluto favorecimento da representação do peculiar enredo, enriquecido pelo ineditismo de uma trilha exclusiva para balé, nada mais nada menos, do que atribuída a Tom Jobim, Água de Meninos - Fantasia Poética da Cia Dalal Achcar fica a merecer, por sua surpresa qualitativa, outras temporadas, aqui e além fronteiras...

 

                                             Wagner Corrêa de Araújo


Água de Meninos - Fantasia Poética/Cia Ballet Dalal Achcar, em temporada na Cidade das Artes, de quinta a domingo, em horários diversos, até 07/12, com grande expectativa para outras apresentações.

Nenhum comentário:

Recente

ÁGUA DE MENINOS / CIA BALLET DALAL ACHCAR : PARTITURA INÉDITA DE TOM JOBIM INSPIRA OS PALCOS COREOGRÁFICOS

Água de Meninos Fantasia Poética em Dois Atos. Dalal Achcar/Éric Frédéric/Concepção Coreográfica/Direcional. Cia Ballet Dalal Achcar. Dezemb...