Quadros de uma Exposição. Coreografia de Alexei Ratmansky. Wiener Staatsoper. Setembro 2021. Fotos/Ashley Taylor. |
Diante do desafio da volta à normalidade dos palcos, o Balé Estadual de Viena e a Orquestra da
Wiener Staatsoper acabam de estrear
uma potencializada performance reunindo, num mesmo programa, titulado como Dança-Imagem-Sinfonias, Mussorgski, Stravinsky e Shostakovich em versões coreográficas de
Balanchine, Ratmansky e Schläpfer.
A belíssima Ópera de Viena,
ainda atendendo às limitações de tempos de pandemia, aparece com um público limitado
e máscaras obrigatórias entre os integrantes da orquestra, sob a conduta do
maestro titular Robert Reimer. Numa
plateia cheia de claros e camarotes vazios, no último dia 21 de setembro, com
transmissão virtual liberada.
Uma visão estranha comparativa à minha primeira vez ali, em março de
1980, então superlotada para aplaudir uma concepção cênica (Filippo Sanjust) primorosa da ópera Falstaff, sob a batuta de Sir George Solti e
contando no elenco nomes como os de Christa
Ludwig e Pilar Lorengar.
Inicializando-se a presente apresentação com a Sinfonia em Três Movimentos,
de 1972, uma das derradeiras incursões de George Balanchine pela obra de Igor
Stravinsky, como um tributo póstumo à morte do compositor um ano antes, para o New York City Ballet. Com sua formatação
neoclássica ainda assim foi considerada, na época, uma obra complexa demais de ser dançada
por suas complicadas contagens.
Mantendo fidelidade ao
original, o Wiener Staatsballets acompanha a sequencia sinfônica, pontuando com
enérgico vigor e gestual atlético quase agressivo o primeiro e o terceiro
movimento, através de 16 bailarinos em variações solistas e grupais, entremeadas por um extenso pas-de-deux marcado por sensual apelo lírico.
A segunda criação coreográfica – Quadros de Uma Exposição (a
partir de uma versão pianística da partitura de Modest Mussorgski) é da lavra do russo/americano Alexei Ratmansky e foi dedicada ao New York City Ballet, onde estreou em
outubro de 2014.
Concebida para dez bailarinos sua performance acontece diante
de projeções frontais de aquarelas de Wassily
Kandinsky com detalhes, de esboços e cores, transmutados para a indumentária
(Adeline André) dos bailarinos.
Carregada de tonalidades poéticas e lúdicas vai revelando aos poucos, em caráter subliminar, um sotaque
de melancolia e amargura, conectando vida e finitude.
Sinfonia em Três Movimentos. Coreografia de G. Balanchine. Wiener Staatsballets. Setembro 2021. Fotos/Ashley Taylor. |
Seus movimentos pulsantes reproduzem o dinamismo gráfico das formas plásticas de Kandinsky. Sendo, sem dúvida, um tocante experimento coreográfico de transito entre a dança e a pintura. Com uma referência mais que especial, motivo de orgulho para os brasileiros, na atuação impecável do bailarino paulista Marcos Menha, de sólida carreira europeia, desde 2003, sendo hoje um dos principais solistas do Balé Estadual de Viena.
Completando o tríptico, em première mundial, a Sinfonie Nr 15, de Dmitri Shostakovich, em impactante transcrição coreográfica pelo suíço Martin Schläpfer. Que sustenta o dimensionamento neoclássico alterativo com transgressivo gestual, ampliado pelas sonoridades soturnas de uma partitura composta em tempos repressivos da era soviética.
Numa fisicalidade corpórea em ambiência sombria que também
aproxima a obra de uma contemporaneidade de risco para a própria sobrevivência da
condição humana, com extrema radicalização nas citações gestuais da solidão e
do desespero diante de perspectivas cada vez mais sem respostas.
E que, segundo Schläpfer, o fez enfrentar um visceral processo criativo “rastejando misteriosamente, em toda parte e em lugar nenhum, distante, insondável, fugidio”...
Wagner Corrêa de Araújo
Sinfonie NR 15. Coreografia de Martin Schläpfer. Estreia mundial - setembro 2021. Corps de Ballet des Wiener Staatsoper. Fotos/Ashley Taylor. |
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