FOTOS/JOÃO JÚLIO MELLO |
Partindo das aptidões dos índios para a movimentação cênica com danças e cantos em autos religiosos, nasceu, com os jesuítas no século XVI, a primeira representação teatral em solo brasileiro.
Mas nem sempre em favor de sua própria etnia quando ,
submissos, faziam papeis da cristandade contrários às crenças míticas na natureza.
E, dominados por falsas promessas e ingênuos agrados , abdicando de seus costumes, sendo ora
dizimados ora escravizados pelos colonizadores.
Com idealizada remissão metafórica no romantismo literário, simbolizada a partir do bom selvagem de Rousseau, no enaltecimento como personagens de escritores , poetas,
pintores e até da criação operística .
Mistificação contestada , com maior pulsão, apenas sob o olhar armado dos escritos de Darcy
Ribeiro e de Antônio Callado. Em visões coreográficas(Balé Stagium) ou na
transmutação da pureza idílica de Iracema em vítima prostituída, no cinema de Jorge Bodanzky.
Mas quase como causa perdida pela insistência da exacerbada
revanche ruralista diante de uma fragilizada politica oficial de demarcação de terras, além do contundente preconceito e habitual menosprezo pelas
minorias raciais.
E é nesta linha conceitual que a dramaturgia de Fernando Marques
propõe um resgate reflexivo em torno da questão indígena em Se eu Fosse Iracema.
Pelo visceral aprofundamento na busca da “possibilidade
de convivência das diferenças”,qual o anti herói macunaímico, com sua lúdica/lúcida fusão comportamental das diversas identidades brasileiras.
O comando cênico de Fernando Nicolau acentua a
contemporaneidade do tema avançando, com desenvolta invenção sensorial, no substrato psicológico e no dimensionamento sociológico de um personagem de trágico arquétipo .
Uma apurada plasticidade é revelada no mix criativo dos elementos técnico/artísticos de luz e
cenografia(Licurgo Caseira), figurinos(Luiza Fradin) e score sonoro ( João
Schmid).
Onde o rendimento cênico da atriz protagonista (Adassa Martins)
instaura , com sua performance solo, rigoroso brilho passional. Fazendo o texto
ressoar com enérgica fisicalidade e
emotiva interatividade palco/plateia.
Em suas passagens tragicômicas de violação e derrota, ironia
e protesto, em meio a esquetes, solilóquios e paródias do homem branco e do
índio.
Teatralizando assim, sem se deixar cair no manifesto óbvio, seu bravo grito contra a marginalização da mais nativa das nossas tribos populacionais.
Wagner Corrêa de Araújo
Wagner Corrêa de Araújo
SE EU FOSSE IRACEMA, em nova temporada, no Centro Cultural Justiça Federal, quarta e quinta, às 19h. 60 minutos. Até 21 de dezembro.
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