SELFIE : NARCÍSICA VIRTUALIDADE



O mítico Narciso está de volta , presente , quase como elo propulsor inconsciente no universo da cibercultura, com a especular postagem , textual e visual ,de vidas privadas nas redes sociais.

Diante da solidão e da incomunicabilidade da realidade tecnológica contemporânea, enclausurados nos bunkers domésticos da mídia virtual, há uma catártico anseio destes "narcisos" serem identificados e admirados pela " beleza " de seus auto - retratos no cotidiano. Sempre compartilhados, sem limites e disfarces, entre seus iguais

Quando “Selfie”, o oportuno texto dramatúrgico de Daniela Ocampo, ironiza a memória humana armazenada em computadores, ao mesmo tempo, acerta ao aliar o riso ao questionamento filosófico deste traço da nossa contemporaneidade.

Impulsionado, ainda, pelo olhar armado da direção ( Marcos Caruso) no alcance do ponto exato de equilíbrio, entre o humor inteligente e a dimensão estética, direcionados à interatividade lúdica e reflexiva da platéia.

E é nesta realidade cibernética que Cláudio( Mateus Solano) encontra seu própria razão de existir, até o momento em que perde todo o seu referencial biográfico/social numa pane de seus computadores.

Sai, então, pela recomposição de seus dados, ao reencontro de onze personagens desconectados, todos protagonizados por um mesmo ator (Miguel Thiré).

Na intencional performance com nuances de pantomima, os dois atores se destacam pelo versátil uso de recursos óticos e auditivos, além da loquacidade verbal ideal. Ressaltados pela uniformidade dos figurinos(Sol Azulay ), pelo original score sonoro( Lincoln Vargas) e movimentação corporal(Arlindo Teixeira), além de uma iluminação quase cinema(Felipe Lourenço).

Falando ao olhos pela força mimética da dupla performance, na sua proximidade com o gestual burlesco, Selfie remete a um mix da linguagem chapliniana e do design fílmico de Jacques Tati.

Atingindo, enfim, a simbológica contradição das viagens internáuticas, no seu visível superficialismo virtual externo e no vazio vaidoso do “selfie” , capaz apenas de nos fazer apaixonar pela visualizante imagem de nós mesmos.


FOTOS BY SERGIO BAIA

( SELFIE está em cartaz no Teatro do Leblon, sexta e sábado, 21h; domingo, 20h. Até 01/Novembro)

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