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Já na ambiência escolar a busca pela solução de cálculos
matemáticos provoca no aluno o dimensionamento psicológico do que um desafio,
questionador sob o compasso algébrico, pode significar como vitória ou derrota,
satisfação ou fracasso emocional.
Assim como, através do tempo de nossa jornada existencial, a
mensuração numérica nada faz senão investigar respostas para o enfrentamento dos transcendentes enigmas
que contextualizam a condição humana, entre o nascimento e a morte.
Somos, afinal, marcados cotidianamente pelos números dos dias,
das horas e das atividades funcionais guiadas sempre pelos significantes e
significados de algoritmos materializados na valoração aritmética e monetária.
Da literatura ao teatro, também ali, é imanente o presencial
do substrato mágico/matemático do pensamento, no raciocínio entre o lógico e o
ilógico, pela indicação ficcional ou poética das formulações e parodoxos de
cada um de seus personagens.
Enquanto Hamlet é defrontado
entre o cálculo do ser e do não ser, versos alexandrinos e sonetos metrificam o
sim e o não do amor em sílabas. E a soma errada pode ser mais um destes palíndromos
ou criptografias, desde a representação dostoievskiana
do “Duas vezes dois igual a cinco”, em Notas do Subterrâneo, ao axioma da frase musical de Caetano Veloso no “Tudo certo como dois e dois são cinco".
Todas estas digressões parecem conduzir à escritura
dramatúrgica, no formato de um monólogo autoral, da atriz Jéssika Menkel com CÁLCULO
ILÓGICO, sintonizada por provocante performance emotiva, no sempre artesanal comando
diretor de Daniel Herz.
Onde ela reflexiona, em linguagem de substrato
poético/coloquial, passagens de sua infância, entre o afetivo das relações
familiares, a puerilidade da meninice e as descobertas adolescentes.
Configurada pela culminância da dor da perda prematura do
irmão, nas circunstâncias de um trágico acidente de trânsito, pela medida
matemática racionalizadora de seu melancólico sentimento da ausência fraternal, na
ilogicidade da resposta aos cálculos de vida.
Em paisagem cenográfica e indumentária (Thanara Schonardie)
ocupada apenas por tríplice formatação de cubos negros, de potencial mobilidade
para os efeitos cênicos/luminares (Aurélio de Simoni), além de uma bicicleta em
estado precário.
Referencial simbólico do atropelamento mortal, junto a vestes
em andrajos incluindo, via fragmentário resíduo da camiseta do irmão Douglas, um tributo metafórico à sua definitiva perda,
extensivo aos acordes de sensitivo apelo sonoro (Éric Camargo).
Num desempenho energizado pela amarração de espontânea fisicalidade gestual enquanto, ao
mesmo tempo, sedutor por seu élan introspectivo, Jéssika Menkel revela, enfim, uma dúplice força ascensional.
Tanto como atriz tanto como dramaturga, de uma geração
emergente predestinada a preencher os palcos e a conquistar o público em busca
de novos e instigantes caminhos para o teatro brasileiro.
Wagner Corrêa de Araújo
CÁLCULO ILÓGICO está em
cartaz no Espaço Rogério Cardoso/Casa Laura Alvim/Ipanema, sexta e sábado, às
19h; domingo, às 18h. 50 minutos. Até 2 de junho.
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