CORPO DE DANÇA DO AMAZONAS : DRAMATURGIA COREOGRÁFICA, AFETIVA E DE DENÚNCIA, PELA PRESERVAÇÃO DO LEGADO AMAZÔNICO

Corpo de Dança do Amazonas/CDA.TA - Como Ser Grande. Mário Nascimento/Direção Concepcional /Coreográfica. Junho/2025. Michael Dantas/ Fotos.


As primeiras abordagens, em dimensionamento sinfônico coreográfico, sobre a Floresta Amazônica foram de Heitor Villa-Lobos. Outros exemplos podem ser encontrados em criações posteriores de diversas companhias de dança brasileira, destacando-se, sem dúvida alguma, entre elas o Corpo de Dança do Amazonas.

No desafio artístico e no empenho patriótico pela valorização do acervo ecológico-ambiental diante de tantos atos depredatórios, às vezes permissivos por grande parte de nossos congressistas na recusa do marco legal dos povos originários. Ou, então, da irrestrita e consentida exploração devastadora de sua foz e do seu acervo florestal, com a consequente poluição de suas águas e a dizimação de suas espécies vegetais e animais.

Diante de tudo isto quando é verificada a trajetória de 26 anos daquela que é a mais importante Cia de dança da Amazônia e do próprio Norte do país, não há como ficar em silêncio mas clamar bem alto por suas qualitativas características estéticas, contando com 22 aprimorados bailarinos, todos eles autóctones daquela região, incluindo parcela significativa de indígenas, ribeirinhos, negros, além dos LGBTQIAP+.

Enquanto no seu repertório prevalecem temas étnicos e regionais voltados não só à valorização da fauna e flora, mas estendendo-se à abrangência de narrativas míticas, das lendárias às históricas, sobre aqueles tão fundamentais povos originários, os nativos, ancestrais  e primeiros habitantes do território brasileiro.  


Corpo de Dança do Amazonas/CDA. Rios Flutuantes. Rosa Antuña/Coreografia. Junho/2025. Michael Dantas/Fotos.


Contando já há cinco anos com a exímia competência direcional e concepcional do coreógrafo mineiro Mario Nascimento que enriquece o repertório com obras originais de sua lavra, estando sempre aberto a contribuições de alguns nomes conceituados da dança contemporânea brasileira e internacional. 

Priorizando temática amazônica, ao lado de releituras de composições icônicas dos séculos XX e XXI, através, entre outros, de Luís Arrieta, Ivonice Satie, Luiz Fernando Bongiovanni, Henrique Rodovalho, Alex Soares, Rosa Antuña. E apresentando nesta oportuna turnê, numa bela iniciativa do Centro Cultural Banco do Brasil, cerca de seis criações que dimensionam bem a proposta da CDA (Corpo de Dança do Amazonas).

No preenchimento de uma caixa cênica minimalista, com extasiante jogo teatral de efeitos luminares (João Fernandes Neto) que alcança, no entremeio de claridades e sombras, um expressivo sugestionamento das diversas ambiências da paisagem florestal e da fluência das correntes aquáticas.

O que aparece, especialmente, na diferencial coreografia de Rosa Antuña, Rios Voadores onde a maleabilidade da corporeidade cênica e o molejo dos movimentos, com seus artifícios gestuais, alcançam uma significativa representação pictórica dos seres originários das águas. Ressaltando que há, ali, uma coesiva exteriorização sob o signo de uma tocante entrega emocional de seus bailarinos, tanto nos solos como nas formações grupais.

Enquanto sonoridades naturais ou eletrônicas, ora gravadas ora ao vivo, numa atemporal trilha do DJ Tubarão, são intermediadas com ruídos da natureza sob ritmos percussivos. Dando um toque de contemporaneidade ao gestual primitivo de corpos em conexão, sempre dialogando com o espaço cênico/visual numa envolvente fisicalidade de contrações musculares rítmicas.

Mas é em TA - Sobre Ser Grande que a CDA encontra seu momento de maior e mais surpreendente potencialidade inventiva e imersiva ao mesmo tempo. Seu simbólico titulo TA é a enunciação verbal de “grande” para os Tikunas, uma das poucas e a maior das tribos indígenas advindas dos povos originários.

A criação de Mário Nascimento estabelece exemplar ressonância do ideário estético/coreográfico de um corpo-linguagem ecoando uma mensagem de esperança, entre reflexos especulares da luta pela sobrevivência de um povo originário e de uma raça indígena, mais os tipos identitários da região, frente às adversidades sob irrefreáveis pulsões de avanços urbanos exploratórios.

A convicta adesão de seu energizado cast técnico de bailarinos, a vigorosa autenticidade da assinatura corporal imprimida por  Mário Nascimento, indo da brasilidade musical e indumentária ao recado de sua tão oportuna temática, fazem, afinal, deste TA pelo Corpo de Dança do Amazonas, um transcendente instante da arte coreográfica em moldes brasileiros...

 

                                       Wagner Corrêa de Araújo


CDA - Corpo de Dança do Amazonas está em cartaz no Teatro I / CCBB/RJ, em horários diversos, até o próximo domingo, 8 de junho,  às 18hs.

Nenhum comentário:

Postar um comentário