Flashes cênicos cariocas, abril de 2014...
"Na atual temporada carioca pode ser observada uma tendência
curiosa - peças que vieram de filmes e vice-versa e ainda uma singular versão
cênica de um filme a partir do registro dramático do fato real que o inspirou".
"Para começar, de um tele-teatro americano anos 50, criou-se
um dos grandes êxitos do cinema que, por sua vez, impulsiona um dos melhores
espetáculos em cartaz no momento - 12 Homens e Uma Sentença, com seu
marcante duelo entre personagens e atores sob a guia de um bravo condutor mor - Eduardo
Tolentino.
Outra inventiva condução teatral, cabe a Victor Garcia Peralta ao extrair de um afinado quarteto de interpretes (Zezé Polessa, Daniel Dantas, Ana Kutner e Erom Cordeiro) o obsessivo relacionamento de dois casais em conflituado e perigoso jogo verbal. Que ultrapassa os limites gestuais da agressividade e da violência entre consortes aparentemente afetivos, através do impactante texto de Edward Albee - Quem
Medo de Virginia Woolf - e do dimensionamento psicofísico imprimido por sua concepção diretorial.
Aí chegamos ao grande fenômeno teatral do momento na cena carioca - Incêndios, com dramaturgia do
libanês Wadji Mouawad. Transformado em filme brilhante, campeão de crítica e de público. E que chega à sua transmutação para o palco sob surpreendente direção de Aderbal
Freire-Filho e o desempenho titânico da protagonista Marieta Severo, ao lado de um
elenco ímpar. É teatro total, com sua atmosfera de tragédia grega, e que conduz o espectador a uma explosiva catarse final.
Completando o ciclo do cinema para o teatro, o conceituado autor da
nova geração de dramaturgos brasileiros - Rafael Primot parte aqui, em Uma Vida Boa, do fato criminal que
levou ao filme Meninos Não Choram, numa concepção mais investigativa em sua incisiva proximidade com a crueza de um retrato sem quaisquer retoques .
Numa incursão de teatro fílmico por seus prevalentes efeitos visuais e plásticos com um referencial estético a la Francis Bacon. Dando hora e vez a uma
jovem atriz (Amanda Vides Veras) em
desempenho comovente, na visceral exposição do conflito de um personagem
verista em processo questionador de sua própria identidade sexual. Num espetáculo imperdível através da singular proposta estética de seu diretor Diogo
Liberano
Do teatro fílmico para o teatro universitário. A maior
surpresa da onda de musicais que invadiu a cena carioca é, sem dúvida alguma, The Book of Mormon, de um original da
Broadway de Trey Parker,Robert Lopez e Matt Stone, apresentado pelo projeto Teatro
Musicado do Centro de Letras e Artes
da UNIRIO, com energizada direção de Rubens Lima Jr.
Ignorando, em sua postulação crítica de sarcástica ironia, o ideário do politicamente
correto o texto se vale da chamada bíblia da religião Mormon para desconstruir, numa pulsão provocadora, o arcabouço academicamente militarizado das religiões. Que constroem prisões espirituais e
físicas para os seus seguidores através do fanatismo levado às ultimas instâncias por pregadores títeres para submissos fiéis.
Aqui, um grupo deles é enviado a uma destas remotas
comunidades africanas sufocada por sua precária condição social, no caso uma subdesenvolvida Uganda onde o colorido nunca é o da África
do Rei Leão. Tudo com um humor cáustico (dando, inclusive, livre espaço
para o palavrão), mas ao mesmo tempo otimista, ao focar a ingenuidade comportamental destes burlescos arautos do evangelho cristão.
Poucas vezes é perceptível tal contagiante entusiasmo público como o visto na instantânea temporada no Teatro Odylo Costa Filho da UERJ, onde o espetáculo
cresceu ainda mais em relação às dimensões físicas de seu espaço original - o
teatro da UNIRIO. Ninguém escapa do envolvimento que estes tão jovens, mas já
tão profissionais atores, provocam com o brilho absoluto de vozes, gestual
coreográfico e performance cênica.
Como vai ganhar o mercado teatral com a entrada ali destes
novos talentos! Que esta bem sucedida aventura do The Book of Mormon continue em outros
espaços logrando o alcance de plateias mais abrangentes, já favorecidas pelo carácter de gratuidade obrigatória como espetáculo de substrato didático e formação universitária.
E que alcance logo outros palcos e plateias, para o bem artístico de todos
e felicidade geral da nação teatral brasileira"...
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