HEISENBERG - A TEORIA DA INCERTEZA: RELACIONAMENTOS QUÂNTICOS

FOTOS/CAÍQUE CUNHA

No universo científico, mais especificamente no campo da chamada física quântica, “é possível medir a velocidade ou a posição das partículas subatômicas, mas nunca ao mesmo tempo”. Prevalecendo, assim, nesta teoria do físico alemão Werner Heisenberg, a impossibilidade de captação da simultaneidade das trajetórias de qualquer um destes microscópicos elétrons na matéria cósmica de um átomo.

E como identificar estas notações físicas com o acaso de caminhos convergentes entre dois desconhecidos sob uma pulsão afetiva, súbita e, porque não, afortunada? E não seriam os elementos da surpresa e do inusitado, a partir dos fatores da incerteza quântica, causa do processo aproximativo à luz daquele comportamental cotidiano?

E que levariam, na velocidade de um elétron, ao despertar da atenção de uma mulher, desinibida e de  meia idade, pelo contraponto da timidez de um envelhecido senhor em postura estática, num banco de estação ferroviária.

Esta é a ação que inicializa a narrativa dramatúrgica, carregada  de estranheza por mais que transpareça habitualidade na sua imanente ambiência comunitária, em Heisenberg – A Teoria da Incerteza, do autor inglês Simon Stephens, aqui, sob um seguro comando diretorial de Guilherme Piva.

Este cruzamento aleatório de duas figuras humanas numa tarde ensolarada na praça de uma cidade qualquer e capaz de remeter às proposições conceituais da chamada Física Quântica, não é o primeiro no contexto da dramaturgia contemporânea. Já tivemos em nossos palcos a peça Constelações( Nick Payne) de enfoque similar em sua aplicação de uma teoria cientifica à temática de uma trama amorosa.

Em atrevida invencione existencial, é Sol(Bárbara Paz),em  tributo póstumo a Solange Badim como tradutora e idealizadora da montagem, que potencializa o jogo de tentativas aproximativas com Alex (Everaldo Pontes). Sem nenhum pejo no recorrer a um gestual(Márcia Rubin) quase obsceno, em narrativas entre a mentira e o imaginário, avançando o sinal vermelho e se atirando obsessivamente sobre ele.

O que detona investidas sequenciais após a rastreada descoberta dele na sua profissionalidade de exercício do ofício de açougueiro. Sem hesitações no encaminhamento do desejo, entre riscos e acertos, até às relações de fato, no domicílio deste respeitável senhor. Com lascívia imunidade a quaisquer diferenças físicas e cronológicas para os propósitos intencionais desta aventureira de sensorial corporeidade, nas suas três décadas a menos que a encolhida fisicalidade de um septuagenário. 

Através de um suporte cenográfico (Sérgio Marimba) condensado no frontalismo de um banco e de um painel e extensivo às suas  mutabilidades luminares(Beto Bruel) entre sombreamentos. Tornando dispensáveis as projeções legendadas indicativas de tempo e espaço, neste acentuar progressivo da ansiedade dos dois personagens em confronto. Com variantes dimensionalidades psicológicas na ocupação dos vazios da condição humana. E amplificado no envolvente score sonoro de Marcelo H.

Onde no contraste indumentário (Antonio Rabadan) entre o chamativo visual feminino e a nuance discricionária do figurino masculino, situa-se a plasticidade da dúplice performance. Na representação de Bárbara Paes sabendo explorar a linha extrovertida de seu personagem com artesanal domínio dramático e preencher, com  vibrante  espontaneidade, os contornos de seu personagem.

Enquanto seu partner Everaldo Pontes, em tom mais confessional e de interiorização, delega emotiva dignidade ao seu papel, especialmente no solilóquio em que é acompanhado por acordes de música barroca.

Transmutando ambos, enfim, sob a bem urdida conduta concepcional de Guilherme Piva, o desalento de seus personagens, em reflexiva remissão e alegre expansividade em  cena.   
                     
                                             Wagner Corrêa de Araújo


HEISENBERG – A Teoria da Incerteza está em cartaz no Teatro Poeira/Botafogo/RJ, de quinta a sábado, às 21h; domingo, às 19h. 80 minutos. Até 26 de agosto.

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