LUDWIG/2 : UM ENIGMA NA MORTE E NA VIDA

FOTOS /JACKELINE NIGRI
Ludwig II, o rei da Baviera,  que ascendeu ao trono aos dezoito anos e foi deposto após  uma conspiração política, sob o  pretexto de  alienação mental, teve uma controvertida trajetória existencial e tanto sua morte, como sua vida(1845/1886), continuam  um enigma até hoje.

Apaixonado pela literatura e pelas artes , teve entre seus ídolos Schiller e Richard Wagner, a quem possibilitou a construção do teatro de Bayreuth(1872), exclusivamente dedicado à representação de suas óperas.Ao mesmo tempo, esbanjou fortunas oficiais na arquitetura de castelos de contos de fadas,  que até hoje são atração turística na Alemanha.

Para atender aos compromissos de herdeiro real manteve um relacionamento formal com a duquesa Sophie Charlotte,  irmã de Elizabeth, a imperatriz Sissi da Áustria. Mas às vésperas das núpcias afastou-se dela , atormentado por seus relacionamentos homoeróticos com jovens plebeus, como seu chefe de cavalaria  Richard Hornig, a quem beneficiou com cargos e vantagens financeiras.

Escandalizou ,assim, com suas atitudes não só os parentes nobres como as classes governantes de seu país, estes últimos inclusive por sua rejeição à política e às guerras nacionalistas,na  priorização de  seus ideais artísticos e suas censuradas aventuras amorosas.

Influenciado pelos heróis românticos wagnerianos, escreveu poemas e textos literários e, no cotidiano, se auto denominava de Rei Cisne , construindo um barco em forma de concha , navegando pelo lago Starnberg, onde ocorreu, na dúvida entre  suicídio ou assassinato,  seu misterioso fim .

A Artesanal Cia de Teatro, especializada em teatro infanto/juvenil, faz com Ludwig/2-Eu Desejo Permanecer um Enigma , sua primeira experiencia adulta  tragicômica, com dramaturgia de Gustavo Bicalho,  que assume a co -direção ao lado de  Henrique Gonçalves/Daniel Belquer.

Resultado de uma residência em Munique, a proposta, com seu enfoque cenográfico atemporal( Linda Sollacher/Karlla de Luca) tem  seu livre referencial na surpresa  dos figurinos(Henrique Gonçalves/Fernanda Sabino) e do inusitado  score  musical( Daniel Belquer/Caeso) de duas épocas .

O ator germânico convidado  Andreas Mayer (Richard Hornig) destaca-se , por uma mais presencial segurança cênica, nos confrontos com o protagonista  Manoel Madeira (Ludwig), que  tem seu melhores momentos na sua sincera entrega aos   solilóquios expositivos de seus conflitos  interiores de  amargura e indecisão.  A participação de Suzana Castelo ( Sophie-Charlotte) é mais recatada  mas, mesmo assim,  alcança a sintonia  necessária com os outros personagens.

A dupla linguagem( alemão/português) estabelece um diferencial na proposta, sem prejuízo da interatividade do elenco masculino e do alcance ao entendimento público. Também as referencias musicais de temas originais, como os de  Tristão e Isolda, não conflitua com sua transcrição atualizadora e  com  as incidências  do pop/eletrônico.

Tendo inspirado o cinema , desde o período silencioso , com versões  de Otto Kreisler(1922),Jürgen Syberberg (1972), Luchino Visconti( 1973) e  Peter Sehr / Marie Nöelle ( 2012),esta presente transposição dramatúrgica do tema biográfico tem uma inventiva estética no mix cronológico de períodos  e de  posturas  sociais  ( como a moderna cena gay ) .

E é esta simbiose que singulariza  a sua  envolvência com o nosso tempo, transcendendo ,de  um epitáfio real,  as verdades  individualistas   e as  vaidades enigmáticas de um homem histórico enquanto personagem contemporâneo.


LUDWIG/2 está de volta, desta vez no Teatro Ipanema, sábado às 21h;domingo e segunda às 20h. 70 minutos. Até 19 de dezembro.

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